Há quase 20 anos que Cláudio Ramos entra na casa dos portugueses através do pequeno ecrã. O apresentador começou a sua aventura na televisão em 2001, no programa "Noites Marcianas", e já fez parte de mais de duas mãos cheias de programas - "Rosa Choque" (2003), "SIC 10 Horas" (2004), "Fátima" (2005), "Queridas Manhãs" (2014), "Contra Capa" (2015) ou "Passadeira Vermelha" (2015) foram alguns dos projetos que abraçou.

Mas foi em janeiro de 2019 que lhe lançaram o desafio de ser o 'vizinho' de Cristina Ferreira. Durante mais de um ano, Cláudio Ramos esteve ao lado da apresentadora no programa das manhãs líder de audiências e que mexeu com o universo televisivo português.

Com o mercado de transferências agitado no pequeno ecrã, os rumores sobre a ida do apresentador para a TVI começaram a surgir no final de 2019 - mas não passavam disso, de rumores. A novidade só chegou no início de fevereiro, quando já se faziam apostas sobre quem seriam o apresentador da nova edição do "Big Brother" - mais uma vez, os boatos provaram estar todos errados.

Cláudio Ramos
créditos: TVI

Nem Teresa Guilherme, nem Manuel Luís Goucha, nem nenhum dos outros nomes apontados: a TVI escolheu Cláudio Ramos, que participou na segunda de edição "Big Brother Famosos", para ser o apresentador do "BB2020", que estreia este domingo, dia 26 de março, inicialmente num novo formato devido à COVID-19 - saiba mais aqui.

Antes do arranque da nova edição do reality show que há 20 anos coloca os espectadores a olhar para dentro da casa mais vigiada do país, o SAPO Mag conversou com Cláudio Ramos.

Quando pensas em televisão, qual a primeira memória que tens?

Lembro-me sempre do Festival da Canção, lembro-me sempre das locutoras de continuidade, lembro-me dos 'Jogos Sem Fronteiras'. Estas são, mais ou menos, as primeiras memórias que eu tenho da televisão. E lembro-me muito da televisão espanhola porque eu via muito televisão espanhola.

E nessa altura, quando vias o Festival, os Jogos sem Fronteiras, a televisão espanhola, já tinhas o bichinho da televisão?

Tive sempre o bichinho da televisão. Sempre. Sempre. Nunca quis fazer outra coisa, nunca me imaginei a fazer outra coisa que não fosse televisão. Nunca me imaginei a fazer outra coisa.

E entre o sonho e a concretização, quais foram os primeiros passos para entrares no mundo da televisão?

Foi o normal da altura, de quem começa numa altura onde não havia coisa nenhuma, nem telemóveis, nem internet, nem nada. Foi a enviar cartas, a concorrer a castings e fazer tudo aquilo que as pessoas hoje quase não fazem porque não é preciso... porque estamos à distância da internet, de um e-mail ou de coisas do género. Eu fazia castings, concorria, sujeitava-me, oferecia-me para fazer e concorria às inscrições nos jornais que diziam 'procuramos apresentador, procuramos não sei quê'. Fui concorrendo e sempre com persistência.

E há algum casting que te tenha ficado na memória? Ou por ter corrido muito bem ou por ter corrido mal?

Nunca nenhum casting me correu muito bem. Fui sempre um desastre nos castings e não fiquei em nenhum. Lembro-me do primeiro que fiz, talvez com 16 anos, em Lisboa, para o 'Clube Amigos Disney'. Recebi uma carta a dizer que tinha sido selecionado e pensei que tinha sido selecionado para apresentar, mas tinha sido selecionado para o casting. Quando cheguei tinha 500 e tal pessoas para serem vistas e essa é uma das memórias. Mas nunca fiquei em nenhum casting.

Cláudio Ramos
créditos: TVI

E como é que foi, então, a entrada no mundo da televisão?

Entrei nas 'Noites Marcianas' porque sabia o que é que ia acontecer.  Gravei uma cassete e vim entregá-la pessoalmente ao doutor Emídio Rangel, à SIC. Quando entreguei a cassete, ele passou a cassete à produtora da Edemol e eles chamaram-me para fazer um casting - aí depois de eu ter mostrado a minha cassete e de ter dito que eu era a pessoa indicada para aquele papel. Aí fiquei.

"Ou fazer bem feito ou, de repente, vem outro e vai para o teu lugar"

E como foi o teu primeiro dia a trabalhar num estúdio de televisão? De finalmente estares a dar os teus primeiros passos...

Lembro-me sempre disso. Mas, para mim, a partir do momento em que comecei a fazer sempre foi um trabalho normal. Percebes? Tinha o objetivo de querer fazer muito bem o trabalho sempre, estar sempre focado no trabalho para que saia sempre muito bem feito.

Nem sei bem se era um sonho... às vezes é que paras e pensas: 'olha, conseguiste realizar o teu objetivo, conseguiste trabalhar naquilo que tu queres'. Na altura não pensava, queria era fazer bem feito porque isto é tudo muito a correr: ou fazer bem feito ou, de repente, vem outro e vai para o teu lugar.

Ao longo destes anos, especialmente na SIC, foste tendo vários desafios. Olhando para trás, quais os momentos ou programas de televisão que fizeste ou que participaste, que mais te marcaram?

Marcou-me muito a 'Tertúlia Cor de Rosa', que foi um programa que eu fiz, um espaço no programa da Fátima Lopes. Marcou-me muito o 'Cara Nova', que era um espaço que eu tinha com a Fátima Lopes e onde falava com pessoas e lhes mudava o visual. Marcou-me depois a 'Capa de Revista', que era um programa que eu tinha com a Ana Marques de manhã, das nove às dez. E depois marcou-me a era em que eu comecei a fazer daytime como apresentador - as 'Sextas Mágicas', substituições da Júlia [Pinheiro] e do João Paulo [Rodrigues].

E, obviamente, o último ano com a Cristina [Ferreira] e o papel de 'vizinho'. Mas eu fui sempre apreciando muito as coisas que fui fazendo, sempre. Fui sempre apreciando e dando valor.

E quais são os maiores desafios de fazer programas de daytime? De estar todos os dias em direto, durante várias horas?

Acho que o maior desafio é tu conseguires fazer uma emissão com três horas sem que as pessoas mudem de canal, isso é muito importante. E depois, conseguires ser tão igual a elas - ser transparente, ser verdadeiro, brincar, chorar... fazer as coisas todas de forma a que elas sintam que és um elemento da família. E ter a capacidade em três horas - o daytime é esquizofrénico, ris num minuto e choras no minuto seguinte - conseguir fazer tudo isso e passar tudo isso com a verdade. Uma história complicada, um consultório complicado, momentos de humor, algo divertido e passar isso tudo com verdade. O principal desafio é as pessoas acreditarem naquilo que tu estás a fazer. É televisão com verdade e não fazer só por fazer.

Cláudio Ramos
créditos: TVI

E falando do último ano: foste o 'vizinho' mais conhecido de Portugal. O programa mexeu com o mercado televisivo português. Como foi entrar neste desafio com a Cristina Ferreira?

Foi um bom desafio, foi um desafio onde eu entrei a medo. Mas rapidamente me entrosei, rapidamente descobrimos quem era o 'vizinho' e foi um crescimento. Foi um momento profissional que eu vivi, possivelmente um dos melhores destes anos todos... mas que vivi, ponto. Já foi, já passou.

Mas pensando no formato... a transferência da Cristina mexeu com o mercado e o programa mudou o daytime - tiveram convidados que normalmente não iam a programa do daytime, fizeram segmentos que normalmente não vemos no daytime. Achas que o daytime mudou no último ano?

Mudou seguramente. Como eu disse na altura, por mérito da Cristina, o daytime passou a ter o prime time da televisão ou melhor: a televisão deixou de ter prime time como se entendia, que era só à noite. Agora, o prime time pode ser também às dez horas da manhã e isso foi provado ao longo de todos os programas que eu fiz com a Cristina e todos os outros que a Cristina continuará a fazer. Isso prova que a televisão é das pessoas e não dos horários. As pessoas gostam de ver televisão a qualquer hora do dia.

Depois deste ano de sucesso ao lado da Cristina, chegou o convite da TVI. A decisão foi difícil de tomar? Ou foi um 'sim' imediato?

Se fosse um convite só por si seria uma decisão difícil. O convite vem para apresentar um formato que eu quero muito apresentar. Apresentar este formato era um objetivo de carreira, era um sonho de carreira e aí foi fácil a decisão. Tudo o resto é um pouco mais complicado porque eu estava ligado a uma casa, onde deixei pessoas.

Mas a partir do momento em que tomei a decisão, ficou decidido e claro na minha cabeça. Não havia volta a dar. No dia em que me despedi, disse adeus porque já sabia que me ia embora tive o tempo todo para fazer a ressaca emocional. Sou muito de olhar em frente. Muito de perceber que o foco é aquele que ali vem, que é aquele agora o objetivo e é nisso que estou focado.

E porque é que o 'Big Brother' era o teu sonho? O que te fascina neste formato?

Fascina-me o facto de eu já ter estado lá dentro. Fascina-me porque é um programa que interage com pessoas, é uma experiência onde tens as pessoas dentro da casa 24 horas por dia e onde podem mostrar as suas personalidades. É uma coisa absolutamente extraordinária lidar com este fenómeno e eu sempre gostei. Sempre vi, vi no estrangeiro, vi em Espanha, no Brasil, em Itália. É um formato que eu gosto e acho que é um formato onde o apresentador é posto à prova em várias formas, de várias maneiras, na mesma gala. E eu, como apresentador, aos 46 anos, sinto que posso e devo passar por isto nesta altura da minha carreira.

E qual é o maior desafio de estar a preparar a nova edição, uma edição especial? É o 'BB2020', é uma cara nova no formato, és tu num novo canal. Quais são os desafios?

O maior desafio é tu esqueceres que há tudo isso à tua volta. É tu perceberes que vais fazer um programa de televisão que tem a importância que tem, mas que tu és a pessoa escolhida para o fazer. Mas és apenas a cara de um formato gigante, com montes de pessoas envolvidas. As estrelas são os concorrentes, não é o apresentador. E há muitas coisas a acontecer e tu tens o peso de deixar tudo isso de lado e de estar focado só no que é importante.

Acho que vou viver a ressaca do 'Big Brother' quando ele acabar. Neste momento, estou focado em fazê-lo. Percebes? Em fazer, em divulgar, em dar o melhor. Não quero nem vou sentir o peso da responsabilidade porque isso tira a espontaneidade aquilo que eu quero que seja o 'Big Brother'.

Cláudio Ramos
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E como tem sido a preparação?

Reuniões, conferências de imprensa dadas a partir de casa por causa do coronavírus... preparação, estudar muito a vida dos concorrentes, ver muito as edições do formato lá fora, ver as dinâmicas, criar conteúdo, inventar promos, discutir com a pessoa que trabalha diretamente comigo sobre assuntos. Tem sido basicamente isto, tem sido mergulhar profundamente e sempre na vida dos concorrentes e na forma como eles podem interagir sozinhos, comigo ou entre eles comigo. O que se pode fazer, o que podemos criar... sabendo que tudo pode ser ao lado porque eles dentro da casa podem ter reações completamente opostas.

No 'Big Brother' terás ao teu lado a Mafalda Castro, a Maria Botelho Moniz e a Pipoca Mais Doce como comentadora. Como vão ser as dinâmicas?

Não posso revelar muito sobre a grelha, mas elas vão estar espalhadas por momentos da grelha - o programa vai estar em vários momentos da grelha da antena. Vão ter diários e uma série de coisas e cada uma delas terá um determinado espaço, mas não posso revelar. Além de não saber, não sou eu que posso revelar essas coisas.

Mas somos todos uma equipa, eu sou só o que apresenta a gala. Somos uma equipa grande e eu estou muito contente com isso.

Cláudio Ramos
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Pensas muito nas primeiras frases que vais dizer ou vai ser tudo no momento?

Vai ser tudo no momento. Não tenho texto escrito, num quis ter, não é uma coisa que goste de ter. Nunca tive no daytime, nunca tive em lado nenhum... vai ser muito do improviso, daquilo que me sair, do que eu sentir no momento. Vai ser: 'é isto que me apetece dizer, é isto que eu vou dizer, é isto que as pessoas querem ouvir neste momento'. Vai ser uma coisa do momento.

"É justo que isto me aconteça, trabalho há muito tempo"

Toda a gente diz que não vê reality shows, mas comentam. Porque é que achas que há preconceito em relação a este formato?

Acho que somos um país de gente preconceituosa nesse aspeto, no que toca a televisão. Não me preocupo muito com isso porque as pessoas também têm preconceitos em dizer que acompanham o daytime, que lêem revistas cor de rosa... as pessoas só não têm preconceito daquilo que não lhes convém. Eu não ligo muito a essas coisas e lido muito mal com o preconceito e, por isso, não me faz diferença absolutamente nenhuma.

Vê quem quer ver e eu quero que muita gente veja. Quero que os que não gostam vejam também para poderem criticar. Quero que os que gostem sintam realmente bem no formato. É justíssima que me seja dada esta oportunidade

E olhando para toda a tua carreira até este momento, achas que era o passo que precisavas de dar?

Acho que sim. Tenho 46 anos, já estou na televisão há mais de 20 anos e faz todo o sentido que me seja depositada essa confiança e não tenho dúvidas disso. Porém, também gostava de dizer que não ambiciono nem nunca ambicionei um programa só meu. Não é nada disso. Eu gosto de fazer duplas em televisão, gosto de trabalhar em equipa e não me faz diferença. É justíssima que me seja dada esta oportunidade porque eu sou um apresentador que provou que pode fazer isto bem feito. Naturalmente, outros gostariam de estar no meu lugar... já houve projetos que gostava de ter feito, que outros colegas meus fizeram.

A verdade é que, até agora, todos os meus colegas - todos sem excepção - me deram os parabéns pela escolha, estão felizes com isto e estou convencido que estão a torcer que isto corra bem. É justo que isto me aconteça, trabalho há muito tempo. Não me caiu do céu.

Cláudio Ramos
créditos: TVI

A televisão tem mudado nos últimos anos, nomeadamente com o nascimento dos serviços de streaming. Como vês a televisão no futuro?

Acho que o futuro passa muito por não veres em direto, mas teres a possibilidade de o poderes ver mais tarde. É um fenómeno que já se foi verificando ao longo do último ano com os programas de daytime. Acho que a televisão como a entendemos se vai manter, acredito que as plataformas vão variar - a minha filha já não olha para a televisão como eu olhei durante tanto tempo; e os filhos da minha filha, quando nascerem, não vão olhar da mesma maneira.

Acho que haverá sempre que vai olhar para esta televisão, para esta televisão generalista como nós a encontrámos - como cinema não acabou como o teatro, como os jogos de futebol transmitidos na televisão não acabou com as pessoas que vão vê-lo aos estádios... há sempre espaço para tudo. O caminho vai afunilando, mas a televisão vai sempre a companhia das pessoas em casa e não tenho dúvida disso. Daqui a 10 anos não será como é hoje e há 10 anos não era como é hoje. Mas cabe-nos a nós ter a capacidade de nos adaptarmos - olha o novo coronavírus, não temos de nos adaptar a ele?

* Entrevista publicada a 13 de março.