A presença de Robin Wright é reforçada e não num sentido de puro marketing — longe disso. Antes porque, objetivamente, a sua presença surge reforçada no plano dramático e também criativo: primeiro, porque a sua personagem, a Primeira Dama Claire Underwood, adquire um peso muito particular nos bastidores da Casa Branca; depois, porque Wright volta a realizar dois episódios (nºs 9 e 12), aliás repetindo a tarefa que já assumira na segunda temporada (episódio nº 10).
A crescente importância de Claire, tanto em termos políticos como emocionais, acontece em paralelo com inevitáveis transformações no comportamento do marido, o Presidente Frank Underwood (Kevin Spacey). Dir-se-ia que a sua ânsia por um poder cada vez mais abrangente e com menos falhas se desenvolve a par da exposição de múltiplos sinais de vulnerabilidade emocional, facto, aliás, reforçado por todas as peripécias que envolvem Thomas Yates (Paul Sparks), o autor contratado por Frank para escrever a sua biografia.
Em boa verdade, Frank surge transfigurado através de uma muito típica tragédia mediática dos nossos dias: as diferenças entre as memórias que emergem e a preservação de uma determinada imagem pública geram tensões que, inevitavelmente, não são fáceis de gerir.
Em todo o caso, sublinhe-se: peripécias como estas que aqui se resumem não constituem, de modo algum, um banal sintoma desse “voyeurismo” mais ou menos encapotado que, tantas vezes, é praticado pelo mais medíocre jornalismo “político”. Pode mesmo dizer-se que o seu tratamento reencontra o espírito de toda uma tradição de Hollywood que passa por autores clássicos como Otto Preminger (1905-1986) ou Billy Wilder (1906-2002). Curiosamente, tal tradição envolve a valorização de uma estrutura psicológica das ações que, nos nossos dias, tende a ser menosprezada pelas mais correntes visões tecnicistas (tanto do cinema como da televisão).
Por alguma razão, o peso do elenco é tão determinante na riqueza dramática da série. De facto, muito para além dos eventuais clichés que se pudessem colar às suas personagens, há aqui uma galeria de atores com talento e capacidade para expor as nuances (psicológicas, justamente) dos mais secretos comportamentos destes peões da cena política.
Destacar o par Spacey/Wright é quase uma redundância, de tal modo, desde o primeiro momento, eles se revelaram decisivos na complexidade humana de "House of Cards". Sublinhemos, por isso, as contribuições de Michael Kelly, no papel do dilacerado Doug Stamper, agora “regressado” à proteção do casal Underwood, e Molly Parker, uma atriz invulgar, de talento muito pouco reconhecido, que interpreta Jackie Sharp, personagem empurrada para um complexo vaivém de confiança/desconfiança com Frank. Também à maneira do classicismo de Hollywood, os secundários, mesmo os mais discretos, são sempre fundamentais.
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