Para além das perdas humanas, agora uma perda para a cultura: a casa e o arquivo pessoal do realizador grego Theo Angelopoulos, Leão de Ouro do Festival de Veneza, em 1980, foram destruídos pelos incêndios que devastaram Mati, nos arredores de Atenas, na Grécia.
Phoebe Angelopoulos, viúva do cineasta que morreu em 2012, disse esta quinta-feira a órgãos locais de comunicação social que, entre os documentos destruídos pelos incêndios de segunda e terça-feira, estão os livros do realizador, muitos deles com dedicatórias de autores seus contemporâneos, toda a correspondência e os materiais de pesquisa dos seus filmes, como "A Eternidade e Um Dia", "Alexandre, o Grande" e "O Passo Suspenso da Cegonha".
Angelópulos foi o cineasta grego mais premiado a nível internacional, tendo sido galardoado com a Palma de Ouro do Festival de Cannes, pelo filme "A Eternidade e Um Dia" (1998), e com o Leão de Ouro do Festival de Veneza, com "Alexandre, o Grande" (1980).
Nascido em Atenas, em 27 de abril de 1935, deu corpo, nos anos de 1960/1970, ao Novo Cinema Grego, que enfrentou modelos da ditadura.
Partiu para Paris no final dos anos 1950, onde estudou literatura na Sorbonne e cinema no Instituto dos Altos Estudos Cinematográficos (I.D.H.E.C.). Regressado à Grécia, em 1964, foi crítico de cinema no diário Mudança Democrática, de 1964, até à imposição da ditadura militar, em 1967.
Dirigiu uma curta-metragem em 1968 (“A Emissão”), e a primeira longa-metragem em 1970, "A Reconstrução", drama a preto e branco inspirado no assassinato de um casal. Com esta obra, Angelopoulos conquistou de imediato os prémios do festival de Salónica e o reconhecimento da crítica do festival de Berlim, em 1971.
Seguiram-se "Dias de 1936" (1972), "A Viagem dos Comediantes" (1975) e "Os Caçadores" (1977), uma trilogia dedicada à história moderna da Grécia, desde a véspera de imposição da ditadura fascista de Metaxas, em 1936, até à queda da chamada ditadura dos coronéis, em 1974.
A trilogia "colocou Angelopoulos entre os pioneiros de um cinema atento à memória de um povo e aos acontecimentos da História", escreveu a Cinemateca Portuguesa, em 2012, quando dedicou uma retrospetiva ao realizador.
Este três filmes foram premiados nos festivais de Berlim e de Cannes (prémio da crítica) e pelo instituto britânico de cinema, firmando o nome do realizador a nível internacional.
Angelopoulos dirigiu ainda mais uma dezena de filmes, como o documentário “Atenas, Regresso à Acrópole” (1983), "Viagem a Citera" (1984), "O apicultor" (1986), “Paisagem na Neblina” (1988), "O Passo Suspenso da Cegonha" (1991), "O Olhar de Ulisses" e "Lumière e Companhia" (1995), "A Eternidade e Um Dia" (1998).
"A Poeira do Tempo" (2008) foi a sua derradeira longa-metragem.
Theo Angelopulos morreu a 24 de janeiro de 2012, aos 76 anos, na sequência de um atropelamento, nos arredores da capital grega, quando procurava cenários para um novo filme, "Outro Mar".
Na altura, a comunidade internacional destacou o trabalho do realizador, a sua abordagem dos problemas sociais, realçando o ponto de vista estético e experimental da sua obra, na história do cinema.
Os fogos de segunda-feira em Mati, na zona leste de Ática, região que envolve Atenas, causaram pelo menos 82 mortos e quase duas centenas de feridos, dos quais 70 continuam hospitalizados, alguns em estado crítico.
Mais de 1.500 casas foram afetadas e mais de 300 viaturas foram completamente destruídas pelas chamas, sobretudo em Mati, um dos bairros periféricos a norte de Rafina, onde muitos habitantes da capital têm segunda casa e onde passam férias de verão.
O Governo de Alexis Tsipras pediu ajuda internacional na noite de segunda-feira, tendo já alguns países respondido com meios de apoio.
Portugal enviou 50 elementos da Força Especial de Bombeiros (FEB) para ajudar a combater os incêndios na Grécia.
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