Lars von Trier está perdoado e de volta ao Festival de Cannes.

O seu novo filme, "The House That Jack Built", uma análise de um assassino em série extremamente inteligente nos Estados Unidos dos anos 1970 interpretado por Matt Dillon, vai entrar na seleção oficial, disse o diretor-geral Thierry Fremaux numa entrevista a uma rádio francesa esta terça-feira. No elenco estão ainda Riley Keough, Bruno Ganz e Uma Thurman.

O polémico realizador dinamarquês tinha sido declarado "persona non grata" após dizer "compreender Hitler" numa conferência de imprensa em 2011 e chegou a usar esse "estatuto" numa t-shirt.

Questionado sobre o tema, Fremaux disse que haveria um comunicado de Cannes sobre von Trier nos próximos dias. Pressionado pelo entrevistador para confirmar se o filme tinha sido adicionado à seleção oficial, este respondeu "de certa forma foi o que fiz".

Conhecido por seu humor negro e caráter provocador, Lars von Trier foge dos jornalistas desde 2011, quando foi declarado "persona non grata" no Festival de Cannes depois de ter expressado a sua simpatia por Hitler e criticado Israel.

Foi a 18 de maio de 2011 que o realizador gelou os presentes na conferência de apresentação de "Melancolia" ao lado de Kirsten Dunst.

"Queria muito ser um judeu mas depois descobri que, na verdade, era nazi. Sabem, porque a minha família era alemã, Hartmann, o que também me dá um certo prazer", declarou, respondendo a uma pergunta sobre a origem alemã da sua família.

"Compreendo Hitler. Acho que ele fez algumas coisas erradas, sim, com certeza, mas consigo vê-lo sentado no seu bunker no final", acrescentou.

Quando Kirsten Dunst, que também tem origem alemã, arregalou os olhos, claramente desconfortável com os comentários, e murmurou para a colega Charlotte Gainsbourg um assustado "Oh, meu Deus, isto é terrível", Von Trier tentou acalmá-la: "Mas há um propósito no fim disto".

"Estou apenas a dizer", tentou explicar, "que acho que entendo este homem. Ele não é o que se poderia chamar de um tipo porreiro, mas sim, entendo muito a seu respeito, e sinto por ele um pouco de compaixão, sim. Mas vamos lá, não sou a favor da Segunda Guerra Mundial e não sou contra os judeus".

Sob o olhar incrédulo dos jornalistas, aparentemente ainda não satisfeito, o cineasta concluiu a sua declaração com uma crítica a Israel e um elogio a Albert Speer, arquiteto oficial do Terceiro Reich.

"É claro que gosto muito dos judeus mas não demais, porque Israel é uma ‘pedra no sapato’. Mesmo assim - como é que termino esta frase? - apenas gostaria de dizer, sobre a arte, que gosto muito de Speer", afirmou, destacando o "talento" do arquiteto nazi, condenado por crimes contra a humanidade.

"O.K., sou um nazi", disse Von Trier, encolhendo os ombros e deixando escapar um riso nervoso.

Apesar de ter pedido desculpa algumas horas depois, não se livrou da decisão do festival em torná-lo "persona non grata, com efeitos imediatos", o que o impediu de voltar a entrar no Palais des Festivals, centro nevrálgico do certame, embora o seu filme continuasse na corrida à Palma de Ouro.

Em agosto desse ano, o realizador voltou a desculpar-se numa entrevista ao jornal francês Libération, dizendo que foi "estúpido" e que, "perante 200 jornalistas sem ter preparado nada", entrou em "pânico".

"Disse coisas idiotas e lamento ter ferido os sentimentos das pessoas. O meu problema é que sou obcecado por conflitos e não consigo impedir-me de os desencadear. Em frente de uma plateia que espera que eu diga alguma coisa, eu faço-o. E quando digo que sou um nazi, depois fico muito chocado por as pessoas acreditarem!", explicou, admitindo ser uma pessoa "complicada".

"Em Cannes, toquei num tema tabu e isso explica as reações violentas. Mas também quero dizer que o politicamente correto está a matar o mundo. Se caímos nesta armadilha, o pensamento ficará empobrecido", defendeu.

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