Em declarações à Agência Lusa,
Margarida Gil, presidente da
Associação Portuguesa de Realizadores (APR) reagiu assim ao Programa do Governo, conhecido na terça-feira, o qual se propõe «ter em conta os resultados de bilheteira e o número de espetadores obtidos pelos filmes anteriores dos produtores e realizadores candidatos a apoios».

«Será que na Secretaria de Estado não há gente que saiba fazer contas? As bilheteiras não pagam os filmes», critica a presidente da APR, querendo acreditar que a medida resulte de «uma certa ingenuidade».

De outra forma, «alguém está a enganar alguém», diz. «Vamos partir do princípio, bondosamente, que é pura ignorância. Mas já chateia tanta ignorância. Se não é ignorância, se não for ingenuidade, quer dizer que vai ser outra perda de tempo que vai custar muito dinheiro ao país».

Os filmes «têm poucos espetadores porque existe uma política de divulgação que liquida o cinema português», sustenta a realizadora, considerando que estas «são as verdadeiras questões».

A APR avisa ainda que vai estar muito atenta ao peso «assustador» das chamadas indústrias criativas, referidas várias vezes no Programa do Governo.

«O Estado nunca conseguiu fazer indústrias criativas. Agora, falido, é que vai fazer indústrias criativas? Porquê insistir no Estado a financiar o mercado quando sabemos que isso não funcionou até agora?», questiona, recordando: «Nunca se fez uma indústria de cinema. Vai ser agora, que o Estado não tem um tostão? Estamos cá para ver, mas eu não acredito nada nisso».

«Há muita gente à espera de ver este país miraculoso, pobretanas, que indústrias criativas é que vai de repente desencantar de uma cartola», ironiza, contrapondo: «Produção. Não me venham com indústrias criativas porque isso é uma conversa enjoativa, que já estamos fartos de ouvir que não serve de nada, é só para enganar».

No que respeita à atividade cinematográfica, o Executivo liderado por Pedro Passos Coelho propõe ainda «concluir, no prazo de seis meses, uma proposta de Lei do Cinema».

Margarida Gil espera que a pasta tenha sido bem passada pela anterior ministra da Cultura, considerando que o secretário de Estado «tem meios para pegar numa Lei do Cinema que está praticamente concluída, que procura obter novos financiamentos de plataformas de comunicação que nos outros países financiam o cinema e aqui estão caladinhos a ver se a coisa passa – é aí que se deve ir buscar, não é desviar o pouco dinheiro que existe».

Considerando «simbolicamente grave» a extinção do Ministério da Cultura – agora Secretaria de Estado –, Margarida Gil realça, porém, que não será assim tão grave «se esse dinheiro for aplicado na produção de filmes».

«Espero bem que limpem o aparelho de Estado daquelas flores que andam a pisar as alcatifas, das meninas e dos meninos muito airosos que custam imenso dinheiro e que têm imensas benesses e que não servem rigorosamente para nada, e toda aquela burocracia que não serve rigorosamente para nada e consome praticamente o dinheiro todo que está na Cultura», descreve. «Já que se baixou de Ministério para Secretaria de Estado, ao menos que se faça uma limpeza naquela gente que anda de corredor em corredor», pede.

SAPO/Lusa