A caminho dos
Óscares 2016
As perguntas foram três e foram iguais para todos. Quem vai ser o grande vencedor, quem é que não pode não receber um Óscar este ano e, claro, tínhamos de fazer uma questão à volta da tão falada polémica racial. Os nossos convidados, todos ligados ao cinema pela profissão, não tiveram papas na língua.
Mário Augusto (Jornalista)
Quem vai ser o grande vencedor dos Óscares?
A certeza maior que tenho é a do DiCaprio. Já não é sem tempo que a Academia faça esse acerto de contas. A personagem tem uma exigencia física e uma entrega fora do comum para o tipo de papéis que levam ao Óscar. Ele é um repetente aplaudido, cresceu muito no cinema e, se há uns anos atrás fazia sempre de DiCaprio, hoje já é talvez um dos maiores atores da sua geração. Vale a pena pensar que há nos seus parceiros da mesma idade alguns nomes que merecem também atenção e destaque, mas o Leonardo tem que ser o vencedor… Se não ganhar é um verdadeiro balde de água fria e os senhores da Academia não percebem nada do que estão a fazer.
Qual o Óscar que querias mesmo ver entregue este ano?
O do Stallone. Ele merece pela dedicação a uma personagem que criou há tantos anos e que ainda lhe continua a render notoriedade. Se lhe derem o Óscar de Melhor Ator Secundário talvez ele deixe ir para a reforma o pugilista… se não, ele ainda vai insistir em continuar aos murros.
#OscarsSoWhite: Polémica real ou exagero?
Esta guerra já não é de agora e uma cerimónia de Óscares sem uma polémica não seria a mesma coisa. Esta ganhou mais força porque realmente a comunidade negra em Hollywood é forte e poderosa, apesar dos senhores da Academia ( tão velhinhos e ortodoxos) continuarem a fazer distinção… Para mim é a polémica do ano, especialmente porque quando o Will Smith ficou de fora, esquecido, foi o início do diz que disse. Mas o cinema não deveria ter cor… só brilho. A festa no final terá o destaque que habitualmente tem, os vestidos vão ser novos e as jóias emprestadas outra vez.
Ana Markl (Radialista, guionista e apresentadora)
Quem vai ser o grande vencedor dos Óscares?
Se a vitória de “Birdman” não estivesse tão fresca, ia apontar para “O Renascido”. O Iñarritu sabe tudo sobre auto-gratificação "espectaculosa" e este filme, sobretudo a nível técnico, está mesmo a pedi-las. Mas, nas categorias principais, talvez as atenções se virem para uma obra mais clássica com uma rica história, como “O Caso Spotlight”.
Qual o Óscar que querias mesmo ver entregue este ano?
Queria mesmo que me caíssem os queixos alegremente se o “Mad Max: Estrada da Fúria” ganhasse Melhor Filme. É, na verdade, o meu favorito.
#OscarsSoWhite: Polémica real ou exagero?
Ambos. É complexo. A Academia ainda carrega uma herança demasiado branca e é preocupante que ainda sintamos isso nas suas escolhas. Porém, se a discussão ficar reduzida a uma questão de quotas, então talvez corramos o risco de transformar uma causa realmente importante num panfleto de condescendência - também ela, por sua vez, demasiado branca.
Filipe Melo (Pianista, argumentista e realizador)
Quem vai ser o grande vencedor dos Óscares?
Pergunta muito difícil. Este ano vi quase todos os candidatos, e não consigo escolher um. Se escolhesse, seria o “Mad Max: Estrada da Fúria”, porque me pareceu o mais sentido de todos. Mas há vários muitos bons. O “Ponte de Espiões”, por exemplo. Não consigo ter uma resposta convicta, por isso vai esta, que é uma dissertação gigante e vazia sobre a indecisão.
Qual o Óscar que querias mesmo ver entregue este ano?
O de melhor animação ao “Anomalisa”, que me pareceu um dos melhores filmes que vi nos últimos anos.
#OscarsSoWhite: Polémica real ou exagero?
Eu sou daltónico em relação a pessoas. Porém, é natural que ainda se coloque a questão do racismo e da igualdade num evento desta dimensão - os EUA têm um passado terrível que ainda não está completamente resolvido. Se estivesse, o Donald Trump nem sequer seria um candidato à presidência. Enfim, eu tenho fé na humanidade, e não acredito que excluiríam uma nomeação por causa da cor de pele de alguém. No entanto... é possível que eu esteja a viver numa pequena bolha actimel, onde vivem unicórnios. Não sei.
Vítor Moura (Jornalista)
Quem vai ser o grande vencedor dos Óscares?
Acredito que este será o ano de “The Revenant – O Renascido” e não necessariamente porque é o filme com mais nomeações; doze, no total. O reconhecimento nas festas dos Globos de Ouro, dos BAFTA da Academia Britânica e também com o prémio do Sindicato dos Realizadores aponta um caminho de glória para o mais recente filme de Alejandro Iñárritu. Reconheço que se trata de um imenso espetáculo visual dirigido de forma exímia e com interpretações notáveis. Ainda assim, creio que lhe falta economia narrativa; com menos meia hora, talvez fosse um filme mais equilibrado.
Qual o Óscar que querias mesmo ver entregue este ano?
Apesar dos muitos anticorpos (e até preconceitos) que rodeiam Leonardo DiCaprio, este deverá ser o ano do primeiro Óscar da sua carreira, depois de cinco nomeações falhadas (quatro como ator, uma como produtor). O papel que interpreta em “The Revenant – O Renascido” é o mais bem conseguido que já teve? Creio que não. Mas está na altura do Óscar, até para reconhecer um talento efervescente e uma percurso singular em Hollywood? Creio que sim.
#OscarsSoWhite: Polémica real ou exagero?
É uma discussão que começou a ganhar mais força na edição de 2015 por causa do domínio dos atores brancos em todas categorias de representação. Este ano, a história repetiu-se e ouviram-se muitas vozes indignadas. A Academia de Hollywood foi sensível e prometeu mudar as regras até 2020. É uma resposta mais reativa do que ativa para garantir maior diversidade nas nomeações. Mas não resolve o problema essencial que é da indústria e está na falta de oportunidades para os atores negros. Condicionar as nomeações para os Óscares com cotas de raça, ou mesmo de género, é distorcer a medida de excelência que eles devem ser.
Vicente Alves do Ó (Argumentista e realizador de filmes como “Florbela”, “Quinze Pontos na Alma” e “O Amor é Lindo… Porque Sim”, que estreia a 10 de março)
Quem vai ser o grande vencedor dos Óscares?
Não me parece que haja um grande vencedor. Esses filmes aglutinadores dos Óscares acabaram há muitos anos. Hoje em dia parece politicamente correcto espalhar o prémio por vários filmes para agradar a um maior número de espectadores e consumidores de cinema. Ganha a Academia, as distribuidoras e os produtores. Até porque esses filmes grandes, universais, são cada vez mais raros. Ocasionalmente aparece um ou outro, mas talvez o mundo esteja demasiado cínico ou demasiado distraído por tanta informação e tanto conteúdo que preenche os cinemas, as redes sociais e a sociedade em geral.
Qual o Óscar que querias mesmo ver entregue este ano?
Estou a torcer pelo documentário sobre a Amy Winehouse. É um daqueles raros seres que volta e meia passam pelo mundo e que deixam uma marca profunda. Pela sua arte e pela sua tragédia. O documentário é extraordinário na sua simplicidade e acutilância e a Amy é um anjo caído que nos apetece salvar sempre que a ouvimos cantar,
#OscarsSoWhite: Polémica real ou exagero?
É exagero. Não vejo ninguém discutir que a comunidade negra domina os prémios da música ou que tem a primazia nos desportos nacionais dos Estados Unidos. Parece-me sempre que forçar uma situação é denunciar uma falta de alternativa. Sendo que os prémios em si têm a importância que têm e nunca serão mais importantes que o filme ou o cinema. Quem é que se lembra dos actores que ganharam os Óscares em 2011? Ninguém. O importante são os filmes. E se forem bons e bem representados, ficam. E isso é que interessa no tempo e na História do cinema.
Tiago R. Santos (Argumentista de filmes como "Amor Impossível", “Os Gatos Não Têm Vertigens”, “Call Girl”, “O Leão da Estrela” ou “A Bela e o Paparazzo”)
Quem vai ser o grande vencedor dos Óscares?
Falho sempre nas minhas previsões, mas estou convencido que o “The Revenant” vai levar a maioria para casa. Melhor Ator para o DiCaprio está garantido, mesmo se tenho dúvida sobre a justiça do prémio – acho que o Fassbender merecia ganhar, nem que seja pelo facto de ter sido obrigado a decorar todos aqueles diálogos do Sorkin. Mas voltando ao “The Revenant”, e apesar de não ser grande fã do filme, parece-me que é o nomeado mais impressionante (pela fotografia, por todas as histórias sobre as condições durante a rodagem que foram alimentando a produção, pelos planos sequência) do ano – mesmo se não é o melhor. “Mad Max: Estrada da Fúria”, num mundo justo, seria o grande vencedor.
Qual o Óscar que querias mesmo ver entregue este ano?
Melhor Ator Secundário para Mark Rylance. E não apenas porque acho que ele está extraordinário na “Ponte dos Espiões”, que é também um belo filme. A verdadeira razão é que sou um enorme fã dos discursos do Rylance. Cada vez que ganhou um Tony (e já foram alguns), foram momentos memoráveis. Desde explicar qual é a melhor técnica para atravessar paredes a descodificar as indumentárias a utilizar na cidade e no campo, é sempre hilariante, inesperado e uma apreciada variação aos aborrecidos agradecimentos a Deus, agentes, colegas e professores primários.
#OscarsSoWhite: Polémica real ou exagero?
É um misto das duas coisas. Acho, com toda a sinceridade, que nenhum ator afro-americano se destacou em particular no cinema “mainstream” americano deste ano (o mesmo não se pode dizer dos latinos e transgénero: Kitana Kiki Rodriguez e Mya Taylor, do “Tangerines”, são brilhantes). Mas é uma questão particular que alerta para um problema que me parece sistémico e geral: o facto dos estúdios de Hollywood serem geridos por tipos brancos que aprovam filmes realizados por tipos brancos e interpretados por tipos brancos. Ou seja, a questão não é só terem sido caucasianos nomeados para as categorias de interpretação. Isso é apenas o reflexo de uma cinematografia "mainstream" que coloca obstáculos a que as minorias sejam representadas não apenas no ecrã, mas também nos centros de decisão. E isso sim, é um problema que deve ser encarado.
A cerimónia dos Óscares decorre este domingo. Acompanhe tudo no especial "A Caminho dos Óscares" do SAPO MAG.
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