A HISTÓRIA: Apelidado de “o maior que nunca chegou a ser”, Sonny Hayes (Brad Pitt) foi o fenómeno mais promissor da Fórmula 1 nos anos 90, até que um acidente na pista quase acabou com a sua carreira. Trinta anos mais tarde, é um piloto nómada de aluguer quando é abordado pelo seu antigo colega de equipa Ruben Cervantes (Javier Bardem), dono de uma equipa de Fórmula 1 em dificuldades que está à beira do colapso.

Ruben convence Sonny a regressar à Fórmula 1 para uma última oportunidade de salvar a equipa e ser o melhor do mundo. Ele vai pilotar ao lado de Joshua Pearce (Damson Idris), o rookie promissor da equipa que quer impor o seu próprio ritmo. Mas à medida que os motores roncam, o passado de Sonny apanha-o e ele descobre que, na Fórmula 1, o companheiro de equipa é o seu mais feroz concorrente - e o caminho para a redenção não é algo que se possa percorrer sozinho.

"F1 – O Filme": nos cinemas desde 26 de junho.


Crítica: Manuel São Bento
(Aprovado no Rotten Tomatoes. Membro de associações como OFCS, IFSC, OFTA. Veja mais no portfolio).

Nunca fui fã de Fórmula 1 nem de desportos motorizados no geral. Simplesmente, não possuo interesse por carros. Dito isto, sempre tive uma curiosidade técnica pelo funcionamento das coisas - desde a importância dos pneus macios ou duros até à aerodinâmica que torna os carros de corrida verdadeiros foguetes. Por isso, quando soube que Joseph Kosinski - cineasta responsável por "Top Gun: Maverick" - ia realizar "F1 – O Filme", com Brad Pitt ("Era Uma Vez... em Hollywood") como protagonista e, naturalmente, fotografado com câmaras IMAX a capturar cenas reais durante corridas verdadeiras, a paixão cinéfila sobrepôs-se à falta de interesse pelo desporto. Junta-se um elenco apelativo e Hans Zimmer ("Dune – Duna: Parte Dois") na banda sonora, não havia maneira de ignorar um dos grandes 'blockbusters' do ano.

"F1 – O Filme" conta então com Kosinski ao volante, conhecido pela sua abordagem inovadora à filmagem de ação com câmaras práticas e envolventes, e escrito por Ehren Kruger ("Top Gun: Maverick"). A história centra-se em Sonny Hayes (Pitt), um ex-piloto que regressa ao circuito como parceiro de corrida de Joshua Pearce (Damson Idris, de "Zona de Perigo"), um jovem talento a correr pela equipa fictícia APXGP. Com Kerry Condon ("Os Espíritos de Inisherin") como a engenheira-chefe e Javier Bardem ("Dune") como o dono da equipa, o filme mergulha no mundo da Fórmula 1 com um olhar tremendamente imersivo.

Comecemos pelo que todos os leitores desejam saber: como são as corridas? Kosinski, juntamente com o seu diretor de fotografia de longa data, Claudio Miranda, levam o público literalmente para dentro do carro. Através de câmaras IMAX montadas em carros reais tal como nos jatos da obra aérea protagonizada por Tom Cruise, muitas vezes durante sessões de treino oficiais, "F1 – O Filme" oferece uma experiência visceral, crua e hiper-realista. A sensação de velocidade, a força G sentida nas curvas, a tensão de cada milésimo de segundo - tudo é capturado de forma tão intensa que se torna impossível não prender a respiração durante as sequências mais alucinantes. É cinema de ação no seu estado mais puro e, neste campo, o 'blockbuster' marca um novo standard.

Zimmer compõe mais uma banda sonora marcante, repleta de temas pulsantes que alimentam a adrenalina das corridas, mas que também sabem recuar para momentos mais íntimos, especialmente nas fases finais da obra. Os últimos temas que acompanham o clímax têm uma carga emocional algo inesperada, mesmo que a narrativa nem sempre consiga acompanhar a magnitude épica da música. A montagem, a cargo de Stephen Mirrione ("Birdman"), é outro destaque. Existe uma fluidez invejável na forma como Mirrione equilibra os momentos de corrida com os segmentos de bastidores, nunca perdendo ritmo, mesmo quando o guião entra em territórios mais convencionais. Aliás, o trabalho conjunto entre montagem e cinematografia resulta numa das obras mais coesas visual e ritmicamente do ano.

O elenco é, como esperado, de alto nível. Pitt, com 61 anos, entrega-se fisicamente a um papel exigente e a química que estabelece com Idris e Condon é, sem dúvida, o pilar emocional da narrativa. Hayes e Pearce aparentam ser muito diferentes – um é veterano, cético e experiente, o outro jovem, ambicioso e ainda um pouco ingénuo – mas ambos possuem o mesmo nível de arrogância e elevada confiança.

O arco que atravessam é de crescimento mútuo e é bem trabalhado, apesar de algumas opções narrativas um tanto forçadas - um bloco de 10 a 15 minutos após um momento-chave inclui decisões de personagem e desenvolvimentos de enredo incompreensíveis. No entanto, a relação entre os dois mantém-se cativante e com o seu humor próprio. Infelizmente, este segmento interrompe a coerência emocional e levanta questões que "F1 – O Filme" nunca chega a resolver, incluindo o completo esquecimento de um evento com importância capital.

Condon brilha como a engenheira que mantém a equipa coesa, oferecendo uma performance carismática e autêntica. No entanto, a tentativa de desenvolver um romance entre a sua personagem e a de Pitt parece pouco orgânica e até retirando valor individual ao que a personagem consegue atingir sendo mulher num desporto de homens, contribuindo para um inchaço no tempo de duração que poderia ter sido evitado. O mesmo se aplica ao enredo envolvendo interesses corporativos e de marketing - temáticas com o seu interesse, é certo, mas tratadas de forma superficial e estereotipada, acabando por não acrescentar muito à história central nem fornecer qualquer comentário mais profundo sobre a comercialização do desporto.

No entanto, "F1 – O Filme" destaca-se verdadeiramente na forma como comunica um aspeto frequentemente ignorado pelos não-adeptos: a Fórmula 1 não é um desporto individual. É um esforço coletivo. Um piloto de topo com um carro medíocre não vence corridas, tal como um carro excelente não é suficiente se o piloto não for competente. Mais ainda, por detrás de cada corrida existe uma equipa enorme - engenheiros, estrategas, mecânicos – que trabalham com a mesma intensidade. Kosinski e Kruger fazem um trabalho notável em mostrar como cada décimo de segundo é conquistado por um grupo, não apenas por um indivíduo. Esta mensagem é reforçada em várias cenas que evidenciam o trabalho em boxes, o planeamento estratégico e os sacrifícios de todos os envolvidos. É aqui que o filme encontra o seu coração: não na glória do pódio, mas no esforço silencioso e partilhado que o torna possível.

Para quem, como eu, não acompanha o desporto, "F1 – O Filme" oferece algumas explicações acessíveis sobre os elementos técnicos da Fórmula 1. Ainda assim, fiquei com a sensação de que havia margem para aprofundar mais - especialmente considerando que a obra não abdica de certo jargão específico que pode confundir os menos familiarizados. Contudo, o equilíbrio entre acessibilidade e autenticidade é conseguido de forma decente.

O argumento não evita os clichés. É previsível no seu desenvolvimento - o veterano relutante, o jovem impetuoso, a redenção através do trabalho em equipa - mas nunca se torna aborrecido. Existe uma determinada honestidade emocional nas personagens, um respeito pelo desporto retratado e uma coesão estrutural que faz com que as mais de duas horas de duração passem a voar. Mesmo com alguns desvios narrativos dispensáveis, a experiência global é tão absorvente que as suas falhas acabam por ter pouco peso no resultado final.

Já para fãs de Fórmula 1, há certamente muito valor acrescentado: 'cameos' de verdadeiras figuras do desporto, menções a circuitos e equipas reais, para além de uma captação audiovisual que, mesmo quando semelhante ao que vemos nas transmissões televisivas, é elevada a um patamar imersivo superior pela escala cinematográfica. Mas "F1 – O Filme" é, acima de tudo, um filme pensado para todos - mesmo para quem não tem interesse no desporto.

Conclusão

"F1 – O Filme" é um triunfo técnico e sensorial, uma montanha-russa cinematográfica que coloca os espectadores no centro da ação com uma intensidade rara. Apesar de alguns tropeções narrativos e uma estrutura familiar, a visão criativa e tecnicamente impressionante de Joseph Kosinski, a banda sonora eletrizante de Hans Zimmer e um elenco empenhado transformam este 'blockbuster' numa das experiências mais entusiasmantes e energéticas do ano. Seja para fãs do desporto ou para meros curiosos, a obra acelera diretamente para o coração do cinema espetáculo com classe, tensão e, claro, muita velocidade.