Ninguém reclamou silêncio, mas também não foi necessário. Foi como se a tradição do fado queimasse na pele, o silêncio impôs-se. Por vezes cedia espaço a breves murmúrios cantarolantes, alguns comentários ou aplausos de quem assistia encantado.

O primeiro andar do Lux ficou repleto para ver e ouvir Carminho cantar. A fadista lisboeta escolheu este espaço à beira Tejo para um concerto que pode vir a ter edição em DVD. A escolha da sala poderia gerar alguma confusão: fado e discotecas nunca estiveram directamente ligados, mas com o começar do espectáculo logo se percebeu que a união era perfeita. O resultado foi um concerto que contou com três palcos, três grupos de músicos, três momentos únicos de fados.

O concerto começou por volta das 23 horas e, durante pouco mais de noventa minutos, Carminho encheu o Lux com a sua voz e presença, cantando sempre com a mesma intensidade e entrega. No primeiro palco apresentou-se com um vestido preto e esteve ao lado do baixista Daniel Pinto e do guitarrista e compositor Diogo Clemente. No segundo usou um vestido vermelho e contou com a companhia de Ruben Alves no piano e de Mário Franco no contrabaixo. No último palco ficou lado a lado com as três guitarras portuguesas de José Manuel Neto, Luís Guerreiro e Ângelo Freire. Espalhados pela sala estavam vários ecrãs gigantes que passavam imagens captadas em directo. Esta encenação visual esteve a cargo do realizador João Botelho.

Em cada troca de palco as guitarras portuguesas preencheram o vazio deixado pela voz de Carminho e todo o espectáculo foi pensado para que não houvesse pausas. E assim o fado encheu o Lux e foi respirado e cantarolado por todos.

A proximidade entre a cantora e o público foi sempre crescendo e Carminho chegou mesmo a misturar-se no meio dos espectadores quando cantou “Marcha D’Alfama”. Foi também durante esta canção que puxou o realizador João Botelho para um pezinho de dança. A fadista esteve ao mesmo nível que o espectadores e estes colados aos palcos. Sempre comunicativa, a fadista contou histórias, confessou enganos e revelou algumas memórias da infância.

Foram cerca de 23 fados, temas do seu primeiro disco “Fado”, fados mais tradicionais como “Tendinha” ou “Marcha de Alfama”, passando por canções que irão fazer parte do próximo álbum da cantora, como “Talvez” e “Meu namorado”, esta com letra de Chico Buarque. O sentimento final foi de amargura, como em alguns dos melhores fados... mas só porque espectáculos deste nível apenas surgem muito de vez em quando e deixam saudades.

Texto e foto @Edson Vital

Alinhamento do concerto:

1.A Voz
2.Bia da Mouraria
3.Meu Amor Marinheiro
4.Maria José
5.Voltar a Ser
6.Raúl Pinto
7.Tejo Corre no Tejo
8.Momento Musical
9.Cravo
10.Carta a Leslie Burke
11.Espelho Quebrado
12.Saudades do Brasil
13.Meu Namorado
14.Nunca é Silêncio Vão
15.Talvez
16.Momento Musical
17.Alfama
18.Rosita
19.Sra. Da Nazaré
20.Uma Vida Noutra Vida
21.Tendinha
22.Marcha D’Alfama
23.Escrevi o Teu Nome no Vento