Disco da semana: O cocktail de Santigold continua apetitoso

"Master of My Make-Believe" demorou quatro anos a chegar mas compensa a espera com um cardápio sugestivo. No seu segundo álbum, Santigold continua a condimentar a sua pop com vários sabores, num alinhamento eclético sem cair na dispersão, e nós continuamos a gostar dessa mistura entre o familiar e o inesperado. "Santogold", o primeiro álbum de Santi White, data já de 2008, o que em muitos casos é suficiente para uma estreia cair no esquecimento, por muito que alguns singles tenham acertado em cheio no alvo - um público na fronteira entre o indie e o mainstream, limites algo difusos na pop deste milénio mas aparentemente convidativos para a música da norte-americana. Quatro anos depois, e com uma ligeira mudança de nome entretanto - Santogold deu lugar a Santigold devido a questões legais -, a cantora e compositora assina um disco que mantém as qualidades da estreia: por aqui, destacamos facilmente a sintonia entre ritmo e apelo melódico ou a profusão de estilos que, apesar dos contrastes, nunca se atropelam. Diga-se de passagem que, só pela coleção de convidados, seria difícil que "Master of My Make-Believe" falhasse por completo: afinal, não é qualquer álbum que pode orgulhar-se de reunir gente como Q-Tip, dois terços dos Yeah Yeah Yeahs, Dave Sitek (dos TV on the Radio), Boys Noize, Diplo, Switch ou até os nossos Buraka Som Sistema. Mas também é certo que bons ingredientes não fazem necessariamente um bom prato e convém ter alguém a doseá-los. Santigold sai-se bem nessa função e apresenta-nos um alinhamento que, mesmo aceitando múltiplas influências, deixa evidente que há aqui uma voz própria (e não mais uma marioneta pop entregue aos serviços de compositores e produtores).<

Videoclip de "Disparate Youth":

Sem procurar pistas para o futuro - nem tendo essa pretensão -, "Master of My Make-Believe" é um bom concentrado de várias tendências do presente combinadas em canções imediatas, que conseguem não cair no óbvio, e arrojadas q.b. sem nunca se tornarem herméticas. Não indo muito além dos três minutos de duração, cada tema tem potencial de single e compõe um disco feito à medida da idade do mp3: todos podem ser degustados isoladamente, mas felizmente o conjunto não soa a uma colagem de fragmentos.

Da pujança de "Go", a abrir, com Karen O e Q-Tip, saltamos para a perfeição pop de "Disparate Youth" (um dos singles do ano, que por enquanto está longe de cansar), aderimos à dança sincopada e tribal de "Fame" ou "Freak Like Me", rendemo-nos ao misto de doçura e melancolia das belíssimas "This Isn't Our Parade" e "The Riot's Gone" (com a guitarra inconfundível de Nick Zimmer a sublinhar a herança de "It's Blitz!", dos Yeah Yeah Yeahs), trauteamos o dub irresistível de "Pirates in the Water" e não conseguimos deixar de fazer o mesmo com a muito 80s "The Keepers". "Master of My Make-Believe" só perde algum sabor no final, com o rap algo forçado de "Look at These Hoes" (sucedâneos de M.I.A. ou Nicki Minaj não, obrigado) ou com uma "Big Mouth" eficaz no seu desvario (com marca Buraka Som Sistema), embora sem o apuro de outros momentos. Nada que quebre o encanto de um segundo disco que só é difícil por dois motivos: pelo tempo que demorou a chegar e pelo que deverá demorar a largar.

@Gonçalo Sá