São uma das bandas reggae mais antigas do país. Na bagagem trazem dez longos anos de carreira e inúmeros concertos nos mais carismáticos palcos de Portugal. Só em Setembro do ano passado, contudo, nos brindaram com o seu primeiro álbum: o místico e intemporal "Allelujah"- uma profunda colectânea de sonoridades rootsy, que contou com as calorosas e espirituais participações de Rita, Kaya, Zoe, Mano, Marley, Pedro, Rafa e Jahlu. Este último, numa simpática entrevista que concedeu ao Palco Principal, revela-nos os princípios que tornam a sua arte tão necessária quão memorável"¦

Palco Principal - Como surgem os One Love Family?

Jahlu - Os
One Love Family surgem na sequência de alguns projectos em que estive envolvido, que não resultaram, devido, essencialmente, à falta de empenho e dedicação de alguns elementos integrantes. Na verdade, eu tinha uma missão, contudo, nem todos a partilhavam, o que foi originando, ao longo dos tempos, a desvinculação dos grupos onde estive inserido. Então, depois de alguns anos em que permaneci "parado" musicalmente - muitos deles passados na Holanda -, olhei ao meu redor, deparei-me com a minha família, com os meus filhos e pensei: por que não incutir-lhes algum traquejo musical e, com eles, criar uma banda? E assim nasceram os
One Love Family

PP - Eis, então, a história que originou o nome da banda"¦

J - Não só, mas também. Contrariamente ao que se possa deduzir, o nome
One Love Family não representa somente a família que constitui a banda, mas toda a gente que o reggae atinge, todos os que acreditam e seguem o Rastafarianismo e toda a tradição e interpretação cultural, espiritual e religiosa que o conceito abrange.

PP - Apesar de a banda já contar, sensivelmente, dez anos de carreira, só recentemente saiu - digamos - do anonimato. Existe algum momento fulcral que, a seu ver, tenha sido determinante para este súbito reconhecimento conquistado nos últimos tempos?

J - Não poderei apontar um momento concreto, fundamental. Tratou-se de uma conquista lenta e progressiva, que foi ganhando forma ao longo dos anos - que já são bastantes. No entanto - há que reconhecer -, o recente convite da Valentim de Carvalho e a consequente gravação do álbum foi importantíssimo, nomeadamente, na divulgação e mediatização da banda.

PP - A propósito, já tinham sido, anteriormente, convidados para gravar e editar um disco. Por que motivo só aceitaram o desafio em 2007?

J - Por uma razão muito simples: até à altura, ou seja, até termos sido abordados pela Valentim de Carvalho, todas as propostas que nos tinham sido feitas não eram suficientemente credíveis. Tratavam-se, pois, de entusiasmos passageiros, que abrandavam, inevitavelmente, perante a consumação da inexistência das condições apropriadas. Simultaneamente, a banda tinha outras prioridades"¦ Era fundamental amadurecer a música! No fundo, segundo o rumo natural da vida, só gravámos em 2007, porque tal não tinha que acontecer antes"¦

PP - Mas, quando aconteceu, aconteceu em grande, não tivessem sido as gravações divididas entre os Estúdios Toolateman, em Carcavelos e o lendário Harry J. Studio, em Kingston. Como foi a experiência de gravar na Jamaica?

J - Apesar de ter sido bastante morosa e cansativa - pois estivemos, durante muito tempo, à espera de disponibilidade - revelou-se, como prevíamos, uma experiência interessantíssima! Foi um enorme privilégio termos sido convidados pelo Earl Chinna Smith para gravar em Kingston"¦

PP - Não só gravaram na Jamaica, como também contaram com a participação de conceituadíssimos músicos jamaicanos na concretização do álbum. Que mais-valias trouxe o contributo de músicos internacionais?

J - A mais importante mais-valia que as colaborações internacionais trouxeram foi a sua vasta experiência no campo da música reggae. Foi espantoso trabalhar com pessoas que crescemos a ouvir! O Sly Dunbar, Dalton Brownw, Everal Ray, Dean Fraser, Robbie Lyn, Danny e Sticky Tompson, Keisha Patterson, Stephen Stewart e Earl Chinna Smith conferiram ao disco uma força incrível!

PP - "Allelujah" - foi a expressão escolhida para dar nome ao álbum. Qual o seu significado?

J - Na expressão "Allelujah" pretendemos conjugar toda a essência e significado da palavra "Alleluia" com a palavra "Jah", que, como sabem, retrata o Deus do reggae. Assim, o título do álbum acaba por gozar de duplo sentido: não só demonstra, através do vocábulo "Allelu"¦" o contentamento por termos, finalmente, concretizado um projecto pelo qual sonhávamos e lutávamos há bastantes anos, como também associa a alegria e o sucesso da sua realização à motivação e inspiração divina de Jah.

PP - Ao longo das 13 músicas que integram o álbum, assistimos a um constante alertar para os mais preocupantes problemas do mundo actual. Entre os vários focados, qual é o que o inquieta mais?

J - Todos são bastante inquietantes, desde a fome à miséria, passando pela guerra, pela poluição, pelo racismo e pela violência"¦ No entanto, todos eles têm origem, essencialmente, numa mesma questão: o materialismo e a negatividade que se apodera cada vez mais dos seres humanos. Na minha opinião, o ser humano é muito "agarrado" à parte negativa e materialista da vida, não procurando alternativas ao mal que o rodeia. Ao longo do álbum, procuro, precisamente, lembrar que há outras alternativas a esta postura: por que não viver mais a natureza? Por que não centrarmo-nos no lado espiritual, no lado positivo da vida? Ou, por que não passar à acção? A cada três segundos morre uma criança no mundo. Agir também é necessário"¦

PP - A seu ver, toda a música deveria ter essa finalidade: ser, simultaneamente, um alerta para os problemas do mundo e um incentivo para a sua resolução?

J - Sem dúvida. Toda a música deveria constituir um alerta. Todos os artistas que encaram, frequentemente, multidões deveriam aproveitar a sensibilidade que a sua música suscita, para passar, a quem os segue e admira, uma mensagem positiva.

PP - Seguramente, será o que os One Love Family irão fazer nos próximos concertos. Onde será feita a promoção do novo álbum?

J - No que respeita a concertos, encontramo-nos, neste momento, a estudar algumas propostas para ir tocar nos Açores, em Portalegre, em Moçambique e no Brasil. Contudo, para já, podemos garantir a nossa presença no Festival Rock na Vila, em Vila de Rei, no dia 20 de Junho.

PP - Centremo-nos, agora, no panorama reggae nacional"¦ Após algumas passagens pelo estrangeiro - nomeadamente pela Holanda e por França -, que diferenças pode apontar entre a cultura reggae portuguesa e as restantes com as quais contactou?

J - O panorama reggae nacional, contrariamente ao panorama reggae de países como a Holanda, não tem grande relevância. É certo que se encontra em evolução, contudo, trata-se de uma evolução muito vagarosa, que não encontra comparação em qualquer outro dos países referidos. Lá fora, a cultura reggae está, sem dúvida, muito mais madura: os artistas têm sempre datas agendadas, os espaços lotados e uma série de editoras discográficas alternativas dispostas a apostar e divulgar a sua música. Na Holanda, por exemplo, existem concertos de reggae diariamente. Em Espanha, França ou Itália, os festivais de reggae são, também, frequentes. Infelizmente, em Portugal não há, ainda, essa mentalidade: os portugueses continuam a associar o reggae a uma sonoridade de verão, o que dificulta a sua divulgação nas restantes estações do ano. Trata-se, pois, dum pressuposto errado, uma vez que o reggae não é um género musical sazonal - sazonal seria o "Merry Christmas""¦ O reggae é, sim, a música da consciência, que deveria ser apoiada e difundida todo o ano.

PP - Fica aqui a sugestão"¦ Mais alguma mensagem que queira deixar aos admiradoras do reggae, mais concretamente, dos One Love Family?

J - Deixo-vos com uma expressão, que tem sido, aliás, uma espécie de cartão-de-visita nosso: "ao acreditarmos na humanidade como uma grande família, somos mais livres". Temos, portanto, que acreditar na união da humanidade, que pensar no Outro como nosso irmão"¦ Temos que mudar em profundidade a nossa forma de actuar, não vá a única solução, à semelhança do que Bob Marley dizia há 30 anos, ser a total destruição! [Jah bless you all]!

Entrevista realizado por Sara Abrantes de Figueiredo Gonçalves Novais

Para ouvir algumas músicas dos
One Love Family visite:
www.palcoprincipal.com/onelovefamily