A “Epitaph Tour” passou por Lisboa ontem à noite. Aquela que é a anunciada como a última digressão dos Judas Priest foi recebida com enorme expectativa e não defraudou. Os Judas Priest dominaram o Pavilhão Atlântico ao longo de duas horas e um quarto e percorreram, sem dificuldade, as cerca de quatro décadas de carreira. Labaredas, fumo, pirotecnia, muitos adereços e um desfile de algumas das imagens mais emblemáticas da discografia da banda de Birmingham acompanharam uma noite de recordações (e emoções, que as despedidas não são fáceis).

O público – que não foi tão pouco como tem sido dito, mas ficou aquém das expectativas para a ocasião… crise, férias? - começou anormalmente morno mas foi crescendo no entusiasmo até terminar à boa maneira portuguesa, entre muitos cânticos e ovações. E os Priest não mereciam outra coisa. Em excelente forma (muito melhor do que em 2005, também no Atlântico, com um concerto que parecia anunciar já uma retirada prematura), o quinteto oscilou entre o poder quase épico de temas como Metal Gods ou Starbreaker, o misticismo e a envolvência de Prophecy, Judas Rising ou Night Crawler e o espírito de puro rock’n roll de Turbo Lover ou Breaking the Law, que o público cantou a plenos pulmões perante um Halford que permaneceu calado e emocionado, num momento de grande cumplicidade.

Painkiller encerrou o set em absoluto delírio e não foi preciso muito esforço para conseguir trazer a banda de volta ao palco. A partir daí, os encores sucederam-se, com The Hellion/ Electric Eye a abrir, seguido do mítico Hell Bent for Leather (e lá entrou a mota), uma aula de canto com o mestre Halford, You’ve Got Another Thing Coming e, a fechar, Living After Midnight. Curiosamente, ainda era um quarto para a meia-noite e o público teria ficado pela noite dentro, de bom grado. À saída, ninguém parecia acreditar que aquela foi, possivelmente, a última oportunidade para ver Priest ao vivo e não é exagero dizer que ainda se viram por ali algumas lágrimas.

Uma noite definitivamente para recordar, com a banda bastante coesa, Rob Halford e Scott Travis a mostrarem grande empatia com o público e o jovem Richie Faulkner (o guitarrista entrou pouco tempo antes da digressão para substituir K.K. Downing, que anunciou a saída em Abril por alegadas dificuldades de relacionamento com os colegas e com o management) a mostrar em palco que mereceu o voto de confiança. Glenn Tipton e Ian Hill mais discretos, mas com a competência que lhes é reconhecida.

Para quem compareceu, fica a memória de toda a classe de uma banda que é sinónimo de Heavy Metal e que parece estar a conseguir cumprir o objectivo que definiu para esta digressão: uma despedida dos fãs e do palco com toda a dignidade.

A tour começou em Junho, na Holanda, e deverá terminar no final do ano, nos Estados Unidos, depois de passar, também, pela América do Sul. Apesar do fim anunciado, os Judas Priest não põem de lado a hipótese de participação em festivais e eventos esporádicos. Entretanto, a música não pára e há novo álbum previsto para o final do próximo ano.

Convidados de luxo

Os Judas Priest não viajam sozinhos e sabem rodear-se de convidados ao mais alto nível. Em Portugal, os Queensrÿche surpreenderam muita gente… Os bilhetes e os cartazes não faziam referência à banda e o site de Priest anunciava-os apenas para o Reino Unido. Mas às 20h00 em ponto, os Queensrÿche entraram em palco para um Atlântico praticamente vazio. Pena. Se os Judas Priest são uma banda de méritos incontestáveis e capazes de atrair multidões por conta própria, a carreira dos Queensrÿche (em especial, os álbuns geniais que marcaram os primeiros anos) também ajudou a cimentar uma grande legião de fãs em Portugal. A banda de Seattle, que deslumbrou na Aula Magna em 2008 com a apresentação, em jeito de musical, dos álbuns conceptuais “Operation Mindcrime I e II”, escolheu alguns êxitos, num alinhamento imprevisível e demasiado curto.

Geoff Tate e companhia foram buscar clássicos como I Don’t Believe in Love, Jet City Woman ou o magnífico Empire, que encerrou a actuação, e deixaram para a próxima uma abordagem mais completa aos trabalhos recentes ou ao novo álbum, “Dedicated to Chaos”, um conjunto de temas conceptualmente brilhantes e apresentados de forma irrepreensível pela banda, mas musicalmente sem grande chama… à semelhança, aliás, do trabalho a solo de Geoff Tate e do que têm feito, na maioria, desde a saída de Chris de Garmo.

Para os fãs, a apresentação deixou um travo amargo. Depois de 2008, a fasquia ficou demasiado alta para a banda, que saiu, também, prejudicada pela duração do set, a roçar os quarenta minutos, pela falta de público devido à hora, e por dificuldades técnicas.

Que voltem depressa, em nome próprio, para apagar da memória uma noite que podia ter sido melhor… Esperemos que, da próxima, se lembrem que já cá tinham estado (a auto-estima lusa anda tão mal-tratada que já não tolera estes esquecimentos, Mr. Tate).

Amanhã, em La Coruña, os convidados são Motörhead e Saxon, que vão acompanhar os Judas Priest nas quatro datas espanholas. Portugueses não vão faltar por lá.

Liliana Nascimento