Scott Kelly voltou a Portugal, depois de uma passagem em 2011, desta vez para apresentar as canções de "The Forgiven Ghost in Me", com dois concertos. este, na Galeria Zé dos Bois, no Bairro Alto, e, no dia anterior, no Passos Manuel, no Porto. Consigo trouxe Noah Landis, também membro dos Neurosis, e Gregory James Dale, que assumem outras guitarras, à direita e à esquerda de Scott, respectivamente. Juntos embarcam numa viagem em formato acústico, marcada por canções de notória influência folk e sulista, que se vestem de preto - como Cash faria -, já que não deixam de ter presente uma certa carga de peso, tanto nas melodias, com acordes graves e por vezes isolados, como nas letras, entoadas pela voz igualmente grave e rouca de Kelly.

O silêncio que se fazia sentir na sala deixava transparecer todo um respeito pelo espetáculo a acontecer. A envolvência de canções como “The sun is dreaming the soul “ ou “We let the hell come” era propensa a este silêncio, numa espécie de hipnose intimista, já que, por breves minutos, todos éramos convidados a entrar dentro da bolha de um homem que está habituado a exteriorizar, acima de tudo, e que aqui nos convida a interiorizar consigo. A pequena galeria estava composta, tendo sido muitos os que ficaram para escutar em pé e se deixaram levar, por uma hora e meia, pelas canções do álbum lançado em 2012.

Lá fora, a chuva batia nos vidros da montra da ZDB e emoldurava a pintura. Muitos foram os que, de passagem, pararam para ver. Com a atmosfera criada, as canções do álbum, como “The Forgiven ghost in me” ou “In the waking hours” sucediam-se como páginas de histórias, e o público, rendido, não arredava pé. Pelo meio, houve tempo para as picardias com Espanha, onde, segundo o próprio Scott, o público não aderiu tanto aos concertos. De facto, o músico de Neurosis não poupou nos elogios ao público português, pelo respeito, pela adesão, pelo entusiasmo, tirando inclusivamente um tempo para falar sobre o espírito destes concertos underground e mais pequenos, da união que se sente, algo que diz ter vindo a experienciar com o passar dos anos.

Foi também a oportunidade para estrear “Eternal Midnight”, uma nova música gravada para a digressão europeia, que levou Noah Landis a pegar num arco de violino para tocar a sua guitarra. “A spirit redeemed to the sun”, a primeira música do álbum, fechou o alinhamento e aliviou o ambiente, pondo fim à dita hipnose. Uma corrente de aplausos levou Scott Kelly a pousar a guitarra, para a pegar novamente de seguida, para uma versão de “Tecumseh Valley” de Townes Van Zandt, que Scott assume ter sido uma das suas grandes influências com o passar dos anos.

A estrada levou-nos até casa, e, ainda que a casa fosse “nossa”, a música era sua. Scott Kelly foi um bom anfitrião e despediu-se, agradecendo toda a atenção e o respeito, com a promessa de voltar, embora não saiba se com os Neurosis, dando a resposta aos pedidos feitos por alguns elementos do público durante o concerto.

Texto: Rita Bernardo

Fotografias: Nuno Bernardo