Os crimes de pirataria digital provocam prejuízos anuais na ordem dos 200 milhões de euros, “estimativas por baixo” segundo uma associação do setor, que pede mais e melhor repressão e investigação criminal para proteger sociedade, cultura, emprego e PIB.

As indústrias culturais têm um peso de cerca de 3% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional, sublinhou Paulo Santos, diretor-geral da FEVIP – Associação Portuguesa de Defesa de Obras Audiovisuais, acrescentando que a perda de 200 milhões de euros em receitas e de 60 milhões de euros em receita fiscal para o Estado são “estimativas por baixo”, ainda que feitas por entidades independentes.

Uma das maiores ameaças ao setor das indústrias culturais e dos direitos de autor vem atualmente das IPTV’s, um serviço online de televisão para o qual apenas é necessária uma ligação à Internet, e é tema em destaque no colóquio que a FEVIP hoje organiza em colaboração com a Polícia Judiciária (PJ), na sede desta polícia, em Lisboa.

As IPTV’s, sublinhou Paulo Santos, são “um fenómeno extremamente pernicioso” e podem oferecer aos clientes um serviço com milhares de canais, de forma ilegal, por mensalidades tão irrisórias como 10 euros, havendo mesmo um operador de grandes dimensões explorado por cidadãos portugueses, que garantem a oferta a partir do estrangeiro, tendo os servidores sediados fora de Portugal e "faturam alguns largos milhões" de euros por ano, sendo um exemplo do caráter transnacional deste tipo de criminalidade, para o qual a FEVIP pretende hoje sensibilizar as polícias internacionais presentes no encontro.

“Não podemos permitir é que fique em causa a normal exploração destas atividades, sob pena de perdermos milhares de postos de trabalho. Não é por acaso que as indústrias culturais representam 3% do PIB. Se não protegermos estas atividades vamos ter problemas seríssimos em termos de emprego, culturais e sobretudo em termos da nossa própria língua, porque se não protegermos os conteúdos de televisão que são maioritariamente portugueses deixa-se de falar português nos media e isso é muito mau, porque a nossa pátria é a nossa língua”, disse Paulo Santos.

O diretor-geral da FEVIP diz que a lei que veio permitir bloquear conteúdos ilegais, através da ação da Inspeção-Geral das Atividades Culturais (IGAC), trouxe “alguns avanços” no combate feito em 'sites', por exemplo, mas não no que diz respeito às IPTV’s, sublinhando que “a tutela penal tem que ser a pedra de toque para combater este fenómeno criminal, de criminalidade organizada, transnacional”.

“Temos uma tutela administrativa que tem alguma eficácia, mas para os grandes casos de criminalidade organizada – e não estamos só a falar de acesso ilegítimo, estamos a falar de burla informática, branqueamento de capitais – aqui sim, há que apostar no trabalho das polícias que tem sido meritório, mas que tem de se desenvolver mais”, disse à Lusa.

“O que queremos no final do dia é que as polícias entendam o que é que os titulares de direitos já fazem para minimizar os efeitos da pirataria e por outro também queremos dizer às autoridades, às polícias, que temos capacidade para ajudar em termos de recolha de matéria indiciária, que permita o desenvolvimento dos processos, acelerar os processos”, acrescentou.

Paulo Santos referiu que Portugal é reconhecido internacionalmente como um país “de vanguarda” no combate a este tipo de criminalidade e um caso de estudo internacional, mas entende que mesmo assim é preciso dar outra prioridade ao combate e “fazer entender ao Ministério Público e às polícias que este é um crime com muitas vítimas, não é um crime sem vítimas”, e que “penaliza fortemente” atores, produtores, realizadores, jornalistas, publicitários, argumentistas, jornalistas, entre outros.

“É este bem jurídico que tem sido encarado em termos de política criminal como um bem jurídico menor, mas não é menor, é bem grande. Não se pode equiparar ao bem jurídico da vida, mas estamos a falar de uma sociedade com emprego”, disse.

Paulo Santos dá dois exemplos: as IPTV’s ameaçam a principal fonte de receitas das televisões generalistas de acesso livre – a publicidade – uma vez que os acessos não são contabilizados para efeitos de audiência, diminuindo o nível de exposição contabilizada dos canais e reduzindo o valor pago em anúncios; e o acesso ilegal a filmes, por exemplo, não permite que as obras tenham a rentabilidade esperada na sua realização, comprometendo investimento futuro.

Em tudo isto a celeridade da investigação criminal tem um papel fundamental, defendeu, porque não faz sentido pensar em bloquear o sinal da transmissão ilegal de um jogo de futebol quando este já terminou, ironizou, referindo que nesta matéria “a questão dos metadados tem que ser definitivamente acautelada”, garantindo-se a sua utilização na investigação criminal, “com proporcionalidade e fiscalização de um juiz”, sob pena de “proteger os criminosos e deixar de parte as vítimas”.

O colóquio ‘Pirataria Digital de Conteúdos Audiovisuais’ junta hoje na sede da PJ o diretor nacional desta polícia, Luís Neves, Paulo Santos, o procurador Pedro Verdelho, coordenador do Gabinete Cibercrime da Procuradoria-Geral da República, representantes de polícias estrangeiras, entre outros participantes.