Trata-se de uma biblioteca pública dedicada ao Médio Oriente e Norte de África, com livros escritos em árabe, persa, hebraico, turco, urdu, farsi, bengali ou hindi, de escritores provenientes daquelas regiões, mas também autores portugueses traduzidos para aquelas línguas, disse à agência Lusa Maria João Tomás, professora da Universidade Autónoma de Lisboa (UAL), investigadora do Observatório de Relações exteriores desta instituição académica (Observare) e uma das impulsionadoras do projeto, localizado na histórica Biblioteca de São Lázaro, na freguesia de Arroios.

Um desses casos é o escritor José Luís Peixoto, já traduzido para árabe, cujos livros foram dos mais requisitados em maio - a biblioteca abriu em março -, mês em que as visitas ultrapassaram a centena.

Outros livros portugueses que vão ser adquiridos são de José Saramago e Fernando Pessoa, em árabe, e estão a ser outros traduzidos, como é o caso de “Os Lusíadas”, fruto de uma parceria com o Camões - Instituto da Cooperação e da Língua.

Nessa coleção bibliográfica, que já ascende a mais de mil livros, a biblioteca dispõe, além de romances, de poesia, ensaio, teatro, livros de história, dicionários, gramáticas e de livros infantis - os que têm mais procura, refletindo a vontade dos pais de as crianças serem bilingues e, apesar de viverem em Portugal e de aprenderem português, de não perderem totalmente o contacto com as suas origens e cultura, explicou a investigadora.

“É uma biblioteca com esta componente muito forte de dar a conhecer a língua e cultura portuguesas aos imigrantes, e as [culturas] destas pessoas destes países, aos portugueses. Tem esta forte componente de interculturalidade”, explicou Maria João Tomás, sublinhando que o desconhecimento da língua e da cultura dos países é um dos maiores entraves à integração das comunidades migrantes.

Nesse sentido, além da biblioteca, foi estabelecida uma série de parcerias, com vista a promover a interculturalidade, nomeadamente com museus, para dinamizar visitas guiadas, que deem a conhecer a cultura portuguesa.

O contrário também acontecerá, com as embaixadas dos países do Médio Oriente e do Norte de África a programarem iniciativas que aproximem os portugueses daquelas culturas, como é o caso de uma “cerimónia do chá com ‘patisserie’”, organizada pelas embaixadas de Marrocos e da Tunísia, para o dia 24 de junho (quinta-feira), que terá lugar na Biblioteca de São Lázaro, e um ciclo de conferências, que podem ser assistidas ‘online’ através da página de Facebook da Junta de Freguesia de Arroios.

Nesse encontro serão abordados tópicos como “Arroios e a encruzilhada de civilizações”, “Heranças árabes na gastronomia portuguesa”, “À descoberta do nosso legado Árabe e Islâmico” e “Fernando Pessoa, leitor da poesia persa e árabe”.

Antes disso, haverá uma outra conferência, mas esta restrita a convidados, que marca a cerimónia oficial de inauguração da biblioteca e do arranque complementar da semana da Cultura e da Gastronomia do Médio Oriente e Norte de África.

Entre os dias 21 e 26 de junho, vai haver “promoções e ofertas deliciosas” em diversos restaurantes com gastronomia originária daqueles países, espalhados um pouco por toda a região de Lisboa, que serão anunciadas em cartazes, por toda a freguesia de Arroios, e também na página de Internet da junta.

Outra iniciativa que arranca em breve é um curso de língua portuguesa de grau zero, que ministra ensinamentos básicos de comunicação aos imigrantes que não sabem falar rigorosamente nada de português, para posteriormente poderem integrar o primeiro nível de ensino, fundamental para terem acesso aos documentos de legalização, explicou a investigadora.

Em julho, está prevista a realização de um ‘workshop’ de culinária, promovido por duas refugiadas fugidas da guerra, uma síria e uma iraquiana, que vão ensinar a cozinhar pratos típicos dos seus países, mas que são legados familiares, receitas passadas pelas mães e que não existem nos livros de culinária, “um património que não encontramos em mais lado nenhum”, destacou a responsável.

No mês de setembro, arrancam quatro cursos de curta duração – 15 dias -, ministrados por professores universitários e certificados com ECTS pelo Instituto Politécnico de Lisboa: “Lisboa Árabe”, “Literatura persa e portuguesa”, “Literatura árabe” e “Alimentação portuguesa e árabe”.

Outra das iniciativas programadas são passeios guiados pela “Lisboa árabe, a anunciar brevemente, ao passo que as visitas nos museus estão agendadas para outubro", disse Maria João Tomás, sublinhando que estas visitas têm uma outra abordagem que não a do museólogo, a académica ou histórica.

Trata-se de visitas feitas por pessoas que estão diretamente relacionadas com o espólio apresentado, e que falam numa perspetiva pessoal e vivencial, da sua experiência particular, como é o caso de uma que ocorrerá na Fundação Oriente, conduzida por um migrante da Índia.

Maria João Tomás adiantou ainda estar previsto as embaixadas fazerem “dias dos seus países, em que vão promover a cultura, o turismo, a música e o artesanato”, apontando as do Egito, Marrocos e Tunísia, como as que já avançaram com essa intenção.

Uma parceria com a Câmara Municipal de Lisboa vai resultar, a partir de setembro, na informatização e disponibilização online de toda a coleção de livros da Biblioteca dedicada ao Médio Oriente e ao Norte de África.

É um projeto “ambicioso”, mas que está a ser cumprido e feito “graças às parcerias que temos”, destaca a responsável.

“Há uma grande adesão de várias instituições que se querem juntar para fazer uma coisa que fazia falta, porque as comunidades estão cada vez maiores e é fundamental. Fundamental [é] dar a conhecer a nossa língua e a nossa cultura, porque senão criam-se guetos e a seguir problemas. E também dar a conhecer a cultura destes países e a língua destes países a nós portuguesas, para evitar ódios e extremismos”.

Na conferência inaugural da biblioteca, na próxima segunda-feira, participam a presidente da Junta de Freguesia de Arroios, Margarida Martins, a secretária de Estado das Migrações, Cláudia Pereira, o presidente do instituto Camões, João Ribeiro de Almeida, o chefe da Missão da Organização Internacional para as Migrações (OIM) em Portugal, Vasco Malta, e a coordenadora do Centro Nacional de Apoio a Integração de Migrantes (CNAIM), Marlene Jordão.

Intervêm também o subdiretor do Museu Nacional de Arte Antiga, Anísio Franco, o coordenador do Instituto Politécnico de Lisboa Paulo Morais Alexandre, e o diretor do Panteão Nacional, Santiago Macias, professor universitário, investigador do Campo Arqueológico de Mértola.

O programa cultural será apresentado por Maria João Tomás, professora universitária, com trabalho de investigação desenvolvido nas áreas do Médio Oriente, História das Religiões, Cultura e Património, Interculturalidade, Geopolítica e História Contemporânea.

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