Em causa está o projeto “Holograma”, que até meados de 2022 visa criar uma produção própria em cada um dos 17 concelhos da Área Metropolitana do Porto, sempre num processo colaborativo envolvendo músicos profissionais da Casa da Música e “públicos sem práticas culturais regulares” nem especial vínculo à criação erudita.

Após uma primeira experiência no município de Paredes, onde a comunidade de etnia cigana criou uma produção ao estilo do teatro de revista e muitos dos seus elementos entraram pela primeira vez numa sala de espetáculos, a equipa afeta ao “Holograma” está agora em Espinho, no distrito de Aveiro, a ultimar os conteúdos concebidos por cerca de 30 utentes de três instituições locais sinalizadas pela autarquia.

Entre esses autores e intérpretes, com idades dos 6 aos 70 anos, incluem-se as crianças que a Associação para o Desenvolvimento do Concelho de Espinho acompanha na zona da Marinha, os adultos e seniores apoiados pelo Centro Social de Paramos e as crianças com e sem deficiência do Centro Comunitário da Ponte de Anta, gerido pela CERCI de Espinho.

Em declarações à Lusa, o curador do “Holograma”, Paulo Neto, disse que o espetáculo "Ó Maria, vem cá ver...  a Feira de Espinho!" constitui assim “um trabalho de laboratório para o qual todos dão o seu contributo individual”, para que, quinta-feira à noite e domingo à tarde, sob a direção dos músicos Ivo Brandão e Ana Isabel Oliveira, suba ao palco um cruzamento entre “texto, música e dramatização”.

As duas encenações terão lugar no Auditório de Espinho, representando o culminar de “uma experiência super-enriquecedora” em que crianças, jovens e adultos acabam “não só a conhecer o palco como local de trabalho, mas também a ver o palco como espectadores, a partir da plateia” – lugar onde são presença rara e com o qual a Casa da Música os quer familiarizar, “aproximando-os da cultura”.

Para isso, até domingo o “Holograma” também leva a Espinho os concertos “Bebéthoven” e “Les Feuilles Mortes”, assim como espetáculos pelo quarteto Ocenpsiea e por solistas da Casa da Música.

No total, serão 12 performances de entrada livre a que Paulo Neto reconhece a capacidade de provocarem “momentos emotivos que vinculem os participantes do ‘Holograma’ – e também as escolas locais e restante público – às artes em geral e à música mais erudita em particular”.

Quanto à continuidade dessa estratégia após as exibições desta semana, o músico alerta: “Estamos só a lançar a semente. Depois é preciso regá-la e deixá-la crescer, e isso passa muito pelas opções culturais da própria Câmara Municipal”.

Lino Rodrigues, presidente do conselho de administração da CERCI Espinho e coordenador do Centro Comunitário da Ponte de Anta, reconhece que durante as 12 semanas de preparação para o “Holograma” as crianças da sua instituição andaram sempre “muito entusiasmadas”, mas realça que, com exceção para os tempos de pandemia, a casa já tinha por hábito desenvolver iniciativas culturais durante todo o ano. “O problema é torná-las mais frequentes”, afirmou.

Apontando como exemplo os concertos em que a Escola Profissional de Música de Espinho oferece convites aos utentes da CERCI, esse responsável revela: “Basta só termos um motorista e ele ter que se repartir pelo serviço do apoio domiciliário para que não possamos ir ao espetáculo a qualquer hora. Depois, ainda é preciso que o auditório nos abra a porta mais cedo e espere por nós, porque, para levar toda a gente até lá, a carrinha tem que ir e vir à CERCI meia dúzia de vezes, até todos ficarem juntos para começarem a ver o espetáculo à mesma hora”.

Para Lino Rodrigues, portanto, as instituições sociais que trabalham com públicos desfavorecidos “até podem ter toda a sensibilidade do mundo para as questões relacionadas com o acesso à cultura”, mas o desinteresse das entidades estatais e municipais quanto à gestão prática do quotidiano dessas organizações “dificulta o financiamento de aspetos tão básicos quando as deslocações e isso acaba por emperrar todo o processo”.

Os miúdos “acham muita piada” ao trabalho de criação coletiva promovido pelo “Holograma” e os idosos que participam no projeto “andam maravilhados”, mas falta acautelar o futuro.

“É preciso que os órgãos de decisão pensem no cenário completo e se lembrem de descentralizar as oportunidades, para também levarem estas experiências aos bairros e zonas mais afastadas do centro”, conclui o presidente da CERCI.

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