“Tudo o que tenho no saco. Eça e ‘Os Maias’” é o título da exposição, uma iniciativa da Fundação Calouste Gulbenkian, em parceria com a Fundação Eça de Queiroz, comissariada por Isabel Pires de Lima.

“A exposição pretende comemorar e acentuar a abordagem do romance, mas procura compulsar outras obras para iluminar a leitura que vamos fazendo de 'Os Maias'”, descreveu a responsável, numa apresentação aos jornalistas.

O pretexto é a passagem dos 130 anos da publicação de “Os Maias”, essa “vaste machine”, como o próprio Eça lhe chamou, numa carta dirigida a Oliveira Martins: “…continuo com ‘Os Maias’, essa 'vaste machine', com proporções enfadonhamente monumentais de pintura a fresco, toda trabalhada em tons pardos, pomposa e vã, e que me há-de talvez valer o nome de Miguel Ângelo da sensaboria. Mas enfim!”.

De facto, no início, o autor teve dificuldades em publicar o romance, um romance no qual dizia que tinha colocado “tudo o que tinha no saco”.

Numa carta datada de 1881, dirigida ao amigo Ramalho Ortigão, Eça escreveu que estava praticamente terminado um romance que tinha escrito, e acrescentou: “Não só um ‘romance’, mas um romance em que pusesse tudo o que tenho no saco”.

Esta frase foi a sugestão para o título da exposição, que pretende mostrar precisamente tudo o que o autor tinha no saco, incluindo peças do seu espólio pessoal.

É o caso da secretária, em que escrevia de pé, sobre a qual se encontra a carta original a Oliveira Martins a propósito da “vaste machine”, tema que abre o primeiro núcleo: “1888 – A Vasta máquina!”.

“‘Os Maias’ foi o romance que mais tempo esteve nas mãos de Eça, que teve má receção da crítica e que só se publica em 1888, apesar de ter sido terminado em 1881”, explicou Isabel Pires de Lima.

Segundo a comissária, a exposição “foi construída em torno do conceito de realismo de Eça, e foi pensada para o grande público, onde coubesse o público escolar”.

A ideia principal é “tentar mostrar quanto Eça é um realista heterodoxo, não seguia a ortodoxia da escola realista. Vamos ver várias práticas de realismo, demos muita ênfase a essa questão”, acrescentou.

A mostra está organizada em “sete núcleos mais um”, sendo este o correspondente ao corredor que acompanha, longitudinalmente, as sete salas temáticas.

Ao longo do corredor há uma barra biográfica e bibliográfica, que é acompanhada de música, uma “banda sonora de uma hora e meia, a tocar em ‘loop’, realizada por Rui Vieira Nery, e que vai fazer referência à música que Eça convoca nos seus romances”, disse Isabel Pires de Lima.

“A exposição vai valorizar a relação de Eça com outras artes, começando na pintura e a acabando na literatura”, com a barra a terminar com uma alusão aos escritores que, nas suas obras, fazem referências a Eça de Queirós, como é o caso de José Eduardo Agualusa, Maria Velho da Costa ou Mário de Carvalho, explicou a comissária, sublinhando que procurou valorizar muito “o diálogo inter-artísitico”.

É por isso que além da escrita, surgem, nas várias salas, excertos de filmes, adaptações cinematográficas dos seus romances – o mais antigo dos quais é um filme de cinema mudo, de 1923, que adapta o romance “O primo Basílio” – assim como caricaturas, pinturas, fotografias, gravura ou música da época.

Neste contexto, a mostra conta com obras de Paula Rego, Júlio Pomar, João Abel Manta, Raphael Bordallo Pinheiro, Raquel Roque Gameiro, Bernardo Marques, Manoel de Oliveira, João Botelho, entre outras obras alusivas ao autor e ao que criou.

Apresentam-se ainda objetos do espólio pessoal do escritor, nunca antes mostrados em Lisboa, como o tinteiro em latão, a palmatória de iluminação, a estante giratória, uma masseira bretã (móvel de madeira para amassar pão) – presente de casamento de Ramalho Ortigão - e uma cabaia chinesa (vestuário de mangas largas usado na China), que lhe foi oferecida pelo Conde de Arnoso, além da já referida secretária sob a qual se encontra o baú onde o escritor guardava os manuscritos.

Em cada sala há blocos folhas com excertos de obras de Eça de Queirós, que os visitantes podem rasgar ou levar para casa.

A exposição conta ainda com peças como a primeira edição de “Os Maias”, a foto que se conhece mais antiga de Eça, onde o escritor surge com 16 ou 17 anos, quando foi para a Universidade, em Coimbra.

As aprendizagens de Eça, a guerra que travou contra o romantismo, a busca da perfeição na arte, o seu dandismo e os lugares por onde viajou e onde viveu são os outros temas que atravessam a mostra.

A exposição vai estar patente até 18 de fevereiro de 2019, e contará ainda com uma programação paralela, que inclui ciclos de cinema, conversas e mesas redondas, leituras e espetáculos, jantares queirosianos e visitas orientadas.