Em entrevista à Lusa, Silvestre Alfama (mais conhecido como Silva), um dos dez músicos do grupo fundado nos anos 1970 por Carlos Alberto Martins (mais conhecido por Katchas), recordou como, no início, ninguém acreditou no funaná.

“Tivemos… não sei se a sorte ou qualquer coisa, a nossa persistência, porque, quando começámos a trabalhar o funaná, na Praia [capital, na ilha de Santiago], havia muita gente que não acreditava, até éramos troçados”, lembra.

Do escárnio – “apelidavam-nos de conjunto de maria ka ‘mporta [não importa]” – à exportação do funaná para todas as ilhas de Cabo Verde foi um passo e até se “começou a dizer que quem tinha problemas de saúde devia ir ao baile do Bulimundo”, conta.

“Fomos os mais persistentes, porque houve outras tentativas antes do Bulimundo, mas o Bulimundo persistiu”, assinala Silva.

O funaná “nasceu de uma forma simples, um instrumento só [um acordeão que em Cabo Verde se chama de gaita], que recorreu ao ferro como suporte rítmico”, explica Silva.

“O ferro nunca foi um instrumento próprio (…). Às vezes até parece que, por causa da necessidade do ritmo, se apanhou qualquer coisa, encontrou-se um ferro e começou a acompanhar. Mas, a partir daí, nasceu o ritmo”, diz.

“A essência do funaná está no seu ritmo”, resume, elogiando as “novas influências”, que, com o atual "movimento da juventude”, estão “a entrar no funaná”.

Segregado durante o tempo colonial, o funaná não podia ser tocado “em certos lugares, normalmente resumia-se à periferia”, relata, considerando que isso teve aspetos positivos e negativos. Por um lado, “o funaná não teve o convívio natural com outros géneros”, mas, por outro, “também conservou toda a sua essência”, observa.

Após uma paragem de duas décadas, o Bulimundo regressou aos palcos há dois anos e, no ano passado, recebeu a medalha de ouro do Estado de Cabo Verde pelo contributo para a cultura do país.

“O Bulimundo ficou sozinho no funaná. Durante anos e anos, quem sustentava a bandeira do funaná era só o Bulimundo”, recorda Silva, que ficou contente por ouvir dizer que Sines, onde tocarão logo, às 00:15, tem uma comunidade cabo-verdiana significativa, que vai “aquecer a festa”.

O Bulimundo atuou no sábado, último dia do Festival Músicas do Mundo, que apresentou dez dias de concertos, primeiro em Porto Covo e depois em Sines.