“Se quiser ir a Mafra fazer uma visita ao palácio ligada a José Saramago não posso, porque, apesar de conhecer a sua obra e poder visitar o palácio ou a vila, falta algo que faça a ligação entre os dois”, afirmou à agência Lusa o investigador Marcelo Gonçalves Oliveira, que leciona a disciplina de Literatura e Destinos Culturais na Universidade Europeia.
No estudo intitulado “Mafra e Saramago. Estratégias de mediação entre um potencial Património Mundial da Humanidade e uma obra-prima literária do Prémio Nobel”, investigadores daquela universidade consideraram que Mafra só tem a ganhar com a promoção do destino através de Saramago e do romance “Memorial do Convento”, inspirado na história da construção do palácio e traduzido em 50 línguas.
Numa altura em que Mafra formalizou a candidatura do palácio a património mundial da UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura, na sigla em inglês), os investigadores recordaram que a ligação do património à literatura universal é um dos critérios apreciados pela UNESCO, que distingue também as “Cidades da Literatura”.
“O facto de não haver referências a Saramago no palácio e na vila não prejudica a candidatura, mas se existissem poderiam beneficiá-la”, enfatizou Marcelo Gonçalves Oliveira.
As referências a Saramago e à sua obra resumem-se à Escola Secundária José Saramago na vila e, no palácio, à peça de teatro adaptada do romance por Filomena Oliveira e Miguel Real e encenada pela companhia Éter, assim como às visitas guiadas para as escolas, porque o escritor é estudado no ensino secundário.
Também as páginas na Internet do palácio e do município omitem a ligação de Mafra à obra de Saramago.
Como justificação, é apontado o facto de Saramago ser considerado um autor polémico pela sua orientação política e antirreligiosa e pela intenção de, no “Memorial do Convento”, “manipular” a história, fazendo do povo que participou na construção do monumento protagonista da narrativa em detrimento do rei João V.
Os investigadores defendem que a literatura pode promover experiências de visitação diferentes e recomendam que se recorra às novas tecnologias para incluir Saramago.
“Em vez de remeter para o escritor, pode remeter-se o ‘Memorial do Convento’, cujas personagens principais Baltazar e Blimunda são muito queridas de quem lê e acabam por representar a população de Mafra”, exemplificou Marcelo Gonçalves Oliveira.
De autoria de Marcelo Gonçalves Oliveira, Maria do Carmo Leal, Maria Isabel Roque, Maria João Forte, Sara Rodrigues de Sousa e Antónia Correia, o estudo foi realizado no âmbito de um projeto multidisciplinar sobre destinos turísticos ligados à literatura, que junta investigadores das áreas da literatura, museologia, antropologia, ‘marketing’ e turismo.
O projeto foi financiado pelo grupo internacional de ensino superior de que a Universidade Europeia faz parte.
A investigação foi dada a conhecer em abril do ano passado, em Coimbra, durante uma conferência da UNESCO.
Após a divulgação do estudo, foi anunciada uma rota cultural por Lisboa, Loures e Mafra inspirada em Saramago e no “Memorial do Convento”.
Em 2017, o Palácio de Mafra foi visitado por cerca de 378 mil pessoas.
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