O tema da conversa "Falamos de quem quando falamos do outro" apresentou o tom inusitado e provocativo das atividades que deverão ocorrer no espaço dedicado à Portugal na maior feira literária do Brasil, que ocorre até 10 de julho.

Isabel Lucas, jornalista e curadora da programação do Pavilhão Portugal, explicou à Lusa que as atividades neste espaço foram pensadas para aproximar autores portugueses e brasileiros através de conversas interessantes capazes de estimular o público a conhecer mais sobre a literatura produzida nos dois países.

“Esta participação [de Portugal] aqui, por mais pequena que seja, por mais simbólica que seja, quer trazer e mostrar um bocadinho da diversidade da literatura feita em Portugal e, uma das preocupações é que as pessoas que vierem aqui ouvir as conversas também possam encontrar os livros dos autores que aqui estão”, explicou Isabel Lucas.

Falando sobre a celebração do bicentenário da Independência do Brasil, que justificou a escolha de Portugal como país homenageado, Isabel Lucas frisou que as comemorações são simbólicas e estão a acontecer dos dois lados do atlântico.

“É um ato simbólico por parte de quem criou e convidou Portugal para estar presente neste ano, esta troca de perspetivas numa data que é importante”, afirmou.

A curadora disse haver uma expetativa positiva sobre o público que deverá participar nas atividades do Pavilhão Portugal.

Quando as portas se abriram, às 10h00 (14h00 em Lisboa) o espaço foi preenchido por um público diverso.

A investigadora Patricia Gomes, de 36 anos, contou que veio à feira literária para comprar livros de autores portugueses, elogiando o espaço.

“O espaço está bem legal, está bem atrativo e tem bastante opção, muitos tipos de livros diferentes”, afirmou.

Já o professor João Florêncio Bastos, 65 anos, disse que o Pavilhão de Portugal “está muito criativo" e que "à medida que se passa pelas divisórias, dentro do espaço, vai-se tendo acesso a muitas informações".

No primeiro debate, mediado por Isabel Lucas, perguntas polémicas sobre a ideia de si e do outro, que passa pela literatura e pela história de Portugal e do Brasil, levaram os autores convidados a refletir sobre os efeitos do colonialismo na formação da identidade brasileira e a relação do país sul-americano com o país colonizador europeu.

“O Brasil foi construído a partir de um pensamento hegemónico, que acabou colocando o diferente e do outro num outro lugar que não era o lugar de ser brasileiro”, considerou Daniel Mundurucu escritor indígena, que tem dezenas livros publicados no Brasil e se dedica a literatura infantojuvenil.

“Era o lugar de serviçal, do selvagem e muito poucas vezes no seu lugar de pertencimento de cada uma das culturas que acabaram formando o que nos somos”, acrescentou.

Refletindo sobre o significado do tema proposto, a antropóloga brasileira Lilian Schwarcz, que é uma das autoras da obra "Brasil, uma biografia" explicou que o conceito do eu e do outro na história e na vida só pode ser entendido numa relação.

“Neste tempo tão odioso, tão intolerante que nos é dado viver passamos a acreditar que o eu e o outro são categorias ontológicas e não são. Só existem em relação (…) A gente vai ao outro não para tentar descobrir o outro porque se você for profundamente naquele outro que você constrói também esse outro vai lhe alterar profundamente. Nossa boa utopia deveria ser familiarizar o outro para estranhar a si próprio”, sustentou.

Já Hugo Mãe, que no ano passado lançou o livro “As doenças do Brasil”, destacou que sempre duvidou e procurou problematizar uma certa pacificação que existe em Portugal em relação a história porque, depois de sair de Portugal, percebeu os efeitos nefastos que o colonialismo produziu no Brasil e noutras partes do mundo.

 Ao longo do debate, houve manifestações políticas contra o atual Presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, por parte do público e dos participantes.

Na sexta-feira, o Presidente brasileiro informou que cancelou encontros que teria com Presidente de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa, em Brasília.

O mal-estar diplomático causado pela mudança de planos não foi mencionado na feira literária, que deverá receber a visita do Presidente português no domingo.

O evento é organizado pela Câmara Brasileira do Livro e a participação de Portugal é da responsabilidade do Camões-Instituto da Cooperação e da Língua, da Direção-Geral do Livro, dos Arquivos e das Bibliotecas (DGLAB), do Turismo de Portugal e da AICEP–Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal, com a Embaixada de Portugal em Brasília e o Consulado-Geral de Portugal em São Paulo.

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