O Teatro Experimental de Cascais (TEC) estreia, na sexta-feira, em Cascais, a peça “O Encoberto”, de Natália Correia, com encenação de Ana Nave, na que é a 186.ª produção da companhia fundada por Carlos Avilez.

Uma peça “agora muito pertinente”, já que “nesta altura estamos num país mais ou menos dividido, com discursos de ódio e esta necessidade de ação, em vez de esperarmos que chegue alguém que nos venha salvar a honra, um redentor”, frisou a encenadora à Lusa.

A peça volta a ser posta em cena pelo TEC, 48 anos depois de Carlos Avilez a ter encenado pela primeira vez.

Natália Correia “partiu de uma espécie de 'mito sebástico' para fazer uma espécie de um aviso de que é preciso agir agora, [em vez de estarmos] à espera de um salvador”, disse Ana Nave à Lusa.

Publicada em 1969, em plena ditadura, a peça “O Encoberto” conta a história de Bonami, rei que se faz passar por D. Sebastião, que tinha por cognome o Desejado ou o Encoberto.

Censurada e proibida pela PIDE, a polícia política, Natália Correia escreveu a Marcelo Caetano, então presidente do Governo, a pedir que a peça fosse levada à cena, por Carlos Avilez, o que não aconteceu.

Só em 1977, três anos após a queda da ditadura, Carlos Avilez encenou "O Encoberto".

A história critica um povo iludido e crente, que se recusa a encarar a realidade, assim como uma falsa nobreza que só pensa em dinheiro.

O relatório da censura, de 1970, dizia: “Trata-se do desenvolvimento em estilo ‘paródia’ de assunto histórico, com não poucas pinceladas pornográficas, à maneira de ‘Natália Correia’, com alusões ao povo português ou a figuras históricas com expressões de chacota e uma clara intenção de ridicularizar”.

A peça que sobe ao palco do Teatro Municipal Mirita Casimiro, no Estoril, é feita com 41 alunos finalistas da Escola Profissional de Teatro de Cascais e os últimos alunos de Carlos Avilez (1939-2023), fundador e diretor do TEC até à morte.

Por isso, “ganha um significado maior e uma atualidade, já que tem sido muito interessante debater e refletir sobre [a obra}”, disse Ana Nave.

A peça “tem uma narrativa que é sobre um Portugal e sobre uma história que é cíclica, que se repete muitas vezes e, sobretudo, [sobre] esta responsabilização de termos um papel na História. Não deixar que nos deem um papel, mas procurá-lo e agir”, frisou a encenadora.

"O Encoberto" conta ainda com um prólogo da autoria de Miguel Graça, que assinou a dramaturgia, a nova versão para palco, e que carrega para o texto o conceito de “Mátria” de Natália Correia, "neste amor ancestral que as mulheres trazem, de que temos de nos encontrar todos", e recusar "um mundo de ódios e de violência”, disse.

“Também porque o papel das mulheres continua a ser fundamental neste equilíbrio como queremos viver”, acrescentou.

Com versão de Miguel Graça e encenação de Ana Nave, a peça tem cenografia e figurinos de Fernando Alvarez, desenho de luz de Tassos Adamopoulos, música original de Manuel Paulo, coreografia de Rita Spider e voz de Ana Ester Neves.

A interpretar estão Luiz Rizo, Sérgio Silva, Teresa Côrte-Real e os alunos finalistas da Escola Profissional de Teatro de Cascais.

A peça pode ser vista até 27 de julho, com sessões de terça-feira a sábado, às 21h00, e, ao domingo, às 16h00.

Entretanto, o TEC mantém aberto o concurso para a 3.ª edição de Texto de Teatro, destinado a premiar uma peça inédita de um autor em língua portuguesa, com tema sobre a identidade.

Os textos a concurso, que terão de ser assinados com pseudónimo, podem ser entregues em mão no Teatro Municipal Mirita Casimiro, no Estoril, ou enviados por correio para a morada do teatro.

O texto premiado, cujo autor receberá um montante de cinco mil euros atribuído pela Fundação D. Luís, será posto em palco pelo TEC em 2026.

O título da peça premiada bem como o seu autor serão revelados em 7 de dezembro próximo, no 'site' e nas redes sociais do TEC.