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O concerto dos Blur deste domingo, em Londres, no final dos Jogos Olímpicos, arrisca-se a ser o derradeiro. Mas não desesperemos: mesmo que não haja novidades em breve, teremos sempre a extensa discografia dos britânicos, alvo de uma completíssima reedição há poucos dias. Ouvimo-la e redescobrimos um dos nomes que mais nos deixam saudades dos anos 90. Depois de, em abril passado, ter anunciado ao The Guardian que a atuação de 12 de agosto no Hyde Park seria, "muito provavelmente", a derradeira dos Blur - e o recente "Under the Westway" o seu último single -, Damon Albarn acalmou os fãs do grupo numa entrevista recente ao The Sun. O vocalista revelou ao tabloide que o concerto será o último deste ano, não necessariamente o de sempre, e até avançou que o quarteto poderia gravar um novo disco, desde que fosse uma banda sonora. Ou seja, este não será tanto um adeus, antes um "até já" de uma banda que os tem cultivado nos últimos anos - recorde-se que "Think Tank", o álbum mais recente, data de 2003. Curiosamente, esta tentação da despedida esteve presente no percurso do grupo logo desde o princípio, ou quase, já que não é segredo que a relação entre Damon Albarn (voz), Graham Coxon (guitarra), Alex James (baixo) e Dave Rowntree (bateria) registou vários episódios tensos ao longo dos seus mais de 20 anos - recordados na luxuosa caixa "21", editada no final de julho, que entre o formato CD, DVD e vinil junta reedições dos sete álbuns de originais do grupo e uma impressionante coleção de material bónus, entre lados b, remisturas ou faixas ao vivo, num apetecível pitéu para admiradores ou curiosos. Tendo em conta fases como as que marcaram "Modern Life is Rubbish" (1993) ou "13" (1999), vincadas por conflitos internos ou com as editoras, chega a ser surpreendente que ainda ouçamos o quarteto ao vivo duas décadas depois do registo de estreia. Adeus, Seymour. Olá, Blur! "Eram bonitos, tinham canções, tinham personalidade. Mas isso também tinham muitas outras bandas da altura", lemos no (muito bem documentado e invulgarmente crítico) booklet da reedição de "Leisure"(1991), disco que apresentou os Blur ao mundo. Ao mundo ou, pelo menos, à sua Londres natal e, gradualmente, ao Reino Unido, uma vez que a estreia do grupo foi discreta face ao sucesso que lhes bateria à porta em meados dos anos 90. Mais do que qualquer outro registo da sua discografia, "Leisure" deve muito aos Seymour, nome que o quarteto adotou quando se juntou, em 1988, antes de optar mudar para Blur (e ainda bem, convenhamos) dois anos depois. Foi, aliás, do primeiro ensaio dos Seymour que surgiu "She's So High", o single de estreia dos Blur, representativo do que ouvimos em "Leisure": uma pop amiga das texturas do shoegaze ou das tendências mais dançáveis do fenómeno madchester, escolas que guiavam muitas das bandas britânicas de então. E por um lado, como o booklet do disco reconhece, os Blur eram só mais uns a eleger os Stone Roses como inspiração. Não se pense, contudo, que esta é uma estreia a atirar para a gaveta de meras curiosidades: "There's No Other Way", single orelhudo e gingão, está à altura das melhores influências; o caráter volátil das relações amorosas (com filtro deliciosamente adolescente) rende belos momentos em "Slow Down", "Come Together", "Fool" (nota alta para as harmonias vocais) ou "Wear Me Down" (com refrão e guitarras bem prazenteiros) enquanto a melancolia, ora serena ora musculada, de "Birthday" espreita outros horizontes que têm em "Sing" o exemplo mais notável, com uma maturidade que contrasta com a inocência "boy meets girl" do resto do disco (anos mais tarde, Danny Boyle faria justiça ao tema repescando-o para a icónica banda sonora de "Trainspotting"). "Leisure" não dá, no entanto, o retrato completo dos Blur de inícios dos anos 90. Ao vivo, um disco polido q.b. cedia espaço a um cenário abrasivo, mais desregrado e exaustivo. Em clubes como o Syndrome, na Oxford Street, por exemplo, onde o grupo tocava ao lado de nomes como os Ride, Lush, Suede, Moose ou Chapterhouse, outras referências de então que, ao contrário dos Blur, foram ficando pelo caminho. "'Leisure' veio dos Seymour, do Syndrome, de sexo e de gritos. E de tocar e tocar em salas de ensaio, no estúdio onde Damon trabalhava, em atuações pequenas e barulhentas", recorda o booklet da reedição do disco. "Embebedávamo-nos muitas vezes. Mas não mais do que outras pessoas com que cresci, só que no nosso caso aparecíamos na televisão quando estávamos assim", realça Dave Rowntree ao recuar até uma época em que o grupo não fazia grandes planos. "Não sabíamos bem o que queríamos, mas sabíamos que queríamos aparecer no Top of the Pops", confessa Damon Albarn. E apareceram, deixando a porta aberta para outros capítulos:<
+ E depois do adeus, Blur? (parte II): A desilusão, o sucesso e a ressaca da trilogia britpop
+ E depois do adeus, Blur? (parte III): América, África e um coração partido
Os Blur atuam a 12 de agosto no Hyde Park, em Londres, no BT London Live, o concerto que encerra os Jogos Olímpicos de 2012. A iniciativa conta ainda com os New Order, The Specials e alguns convidados especiais.
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