Carla Pires celebra 20 anos de fado com um novo álbum, “Vai e Vem”, afirmando-se “grata” por uma carreira “pouco reconhecida” pelos portugueses, mas disposta a “não desistir”.
Em entrevista à agência Lusa, Carla Pires afirmou: “De certa forma, tenho muita pena de o reconhecimento no estrangeiro não ter o mesmo efeito cá, no meu país”. A criadora de “Boca da Noite” (Miguel Martins/Vitorino Salomé) disse que tem sido “uma luta para ter essa afirmação”, “mas é o que é”.
Neste álbum celebrativo, a artista interpreta três temas novos, entre os quais “Dia de Balanço” (João Monge/Amélia Muge) e “Sozinha Comigo”, da sua autoria, que gravou no Fado Cravo, de Alfredo Marceneiro. Recupera igualmente êxitos da sua carreira.
Um dos temas que voltou a gravar foi “Cartografado” (Amélia Muge), do álbum homónimo saído em 2020, e que apontou como o seu melhor, que “não teve um percurso [de públicos] como o imaginado”, devido à pandemia de covid-19, que não permitiu a sua apresentação em tantos concertos, como habitualmente a cantora agendava. Carla Pires confidenciou à Lusa a "saudade" que sente dos períodos de agendas com muitas datas de espetáculos além-fronteiras.
Referindo-se à pandemia, a intérprete disse que foi um “período difícil” e que lhe “custou a passar”, habituada a digressões internacionais com mais de 20 datas.
A intérprete de "Trago o Fado nos Sentidos" (Amália Rodrigues/José Fontes Rocha) afirmou: “Para mim ["Cartografado"} foi o melhor álbum da minha carreira, cada álbum teve o seu caminho e o seu percurso, mas, para mim, é o álbum onde me revejo”.
“Cartografado” foi quarto álbum de Carla Pires, ao qual sucede “Vai e Vem". A criadora de “Tudo o que não há” (Amélia Muge) tem editado, periodicamente, nestes últimos 20 anos, um álbum de quatro em quatro anos - “Ilha do meu fado” (2005), “Rota das paixões” (2012), “Aqui” (2016) e “Cartografado” (2020).
O novo álbum, “Vai e Vem”, está apenas disponível nas plataformas digitais. A intérprete disse que se chegou a pensar numa edição física, mas optou-se só pelo digital, “o que é uma pena”, considerou, referindo que “cada vez mais se está a perder o disco, o CD, o livro”.
Sobre o novo álbum, a fadista disse que na prática “é uma compilação" com "três temas novos que são muito intimistas". "É um marco na minha carreira, e reinvento-me a mim própria. É o início de uma nova fase da minha vida enquanto cantora”, afirmou, recordando que antes de ter optado pelo fado, cantava já há dez anos, pelo que celebra 20 anos no fado, numa carreira musical de 30 anos.
Sobre a escolha do título, “Vai e Vem”, Carla Pires disse que "a nossa vida acaba por ser isso, tem ciclos, tão depressa estamos lá, como estamos cá, voltamos, voltamos a ir”, e acrescentou que “tem a ver com todas as viagens, e com as saudades”.
O álbum “partiu da ideia de celebrar os 20 anos de fado, reunindo os temas" que, durante os concertos, a "marcaram mais em cima do palco" e também aqueles que sentiu "serem mais caros ao público”.
Carla Pires enfatizou a importância dos palcos e das canções serem “experimentadas na estrada”, passando “as mudanças normais e tendo a recetividade do público". "Quando mais tarde as vamos interpretar, já estão completamente diferentes”.
A criadora de "O Povo Canta na Rua" (Eduardo Paes Mamede/Afonso Dias/Carla Pires) afirmou-se “muito mais uma artista de palco do que de estúdio”: “Eu sinto isto, dou muito mais quando estou em palco, o estúdio para mim é frio, não tenho lá o público, as emoções não fluem, acabo por não as mostrar, como as mostro no palco”.
Referindo-se à arte do canto, a criadora de “Voar” (Paulo Pires de Lima/Artur Guimarães) defendeu “a interpretação”. “Não são os decibéis, os gritos, não tem a ver com projeção [da voz], nada disso, tem a ver com o sentir, a emoção, com a alma e, no fundo, com a interpretação das palavras”, argumentou.
A cantora realçou um dos temas inéditos, “Partir”, de sua autoria, musicado por Nuno Tavares, que foi “a base” deste álbum. Quando escreveu este tema, confessou, “ponderava até sair de Portugal, e tentar outro trabalho lá fora”. “Daí o ‘Partir’, e falar da bagagem, das emoções e da tristeza”.
“Eu estou aqui e não desisto, estou de braços abertos para receber o que o universo tiver para mim”, concluiu Carla Pires à Lusa.
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