
O cartoonista Joaquín Salvador Lavado, mais conhecido pelo pseudónimo "Quino", o criador da emblemática Mafalda, morreu esta quarta-feira aos 88 anos, avançou a imprensa argentina.
As aventuras de Mafalda - a contestatária menina de seis anos fã dos Beatles, defensora da democracia, dos direitos das crianças e da paz e detratora da sopa, das armas, da guerra e do James Bond – foram criadas entre 1964 e 1973, mas as mensagens irónicas sobre a sociedade e em prol de um mundo melhor continuam intemporais.
À primeira vista, Mafalda podia ser uma menina de seis anos, reguila, desafiadora e descarada, mas depressa se percebeu que da sua boca, dos balões que Quino preenchia, saíam comentários mordazes e pertinentes sobre a ordem do mundo, a luta de classes, o capitalismo e o comunismo, mas também, de forma mais subtil, sobre a situação política e social argentina.

Era a Mafalda, a contestatária e insatisfeita, “uma heroína zangada que recusa o mundo tal como ele é”, descreveu Umberto Eco em 1969, num prefácio a um dos álbuns que Quino dedicou à personagem.
“Olhando para as coisas que fiz todos estes anos, percebo que digo sempre as mesmas coisas e que continuam atuais. É terrível, não?”, referiu Quino, numa entrevista à agência noticiosa espanhola EFE em 2016.
O criador de Mafalda referia-se aos seus “temas de sempre”, como “a morte, a velhice, os médicos e outras coisas”, com os quais pretendeu fazer pensar os seus leitores durante várias décadas.
Questionado se essas histórias e outros temas que se manifestam no mundo atual têm uma solução, Quino revelou descrença: “Conhecendo o género humano, não acho que exista solução”.
Sobre o panorama atual do seu país de origem, a Argentina, Quino admitiu: “Com muita amargura de ver o péssimo nível de tudo. Um estado de espírito que é extensível à pequena Mafalda, segundo o ilustrador.
Uma das última vezes que o artista foi visto em público foi em janeiro de 2015, numa manifestação em Buenos Aires para repudiar o ataque ao semanário satírico francês 'Charlie Hebdo'.
“Mafalda teria uma tristeza terrível pelo atentado”, disse então Quino, que compareceu em cadeira de rodas e com um cartaz que dizia: “Eu sou Charlie”.

Esta quarta-feira, o jornal espanhol El País recorda ainda a resposta de Quino quando lhe perguntaram como seria Mafalda na atualidade. Segundo a publicação, o autor contrapôs que provavelmente essa "menina sábia" estaria morta, porque seria um dos desaparecidos da ditadura militar argentina (1976-1983).
Distinguido ao longo da sua carreira com vários galardões, como a Medalha da Ordem e das Letras de França e o Prémio Príncipe das Astúrias da Comunicação e Humanidades, Quino, reconheceu que gostaria de ser recordado como “alguém que fez pensar as pessoas sobre as coisas que acontecem”.
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