O disco, gravado pelo Ensemble Darcos, conta com a participação da soprano Ana Quintans, "cuja voz encaixa perfeitamente na interpretação dos temas de John Dowland (1563-1626)", compositor inglês que foi contemporâneo de William Shakespeare.

À agência Lusa, o compositor português afirmou que o álbum "pode ser visto como uma ‘banda sonora' para se ouvir hoje John Dowland".

"Criou-se um contraste entre as ‘lute songs’ originais de Dowland" e as peças instrumentais" escolhidas por Côrte-Real, dentro de géneros musicais barrocos, como a pavana ou a fuga.

Para além de Dowland, os compositores escolhidos são "favoritos" de Nuno Côrte-Real, nomeadamente Sérgio Azevedo, de quem se interpreta Prelude ou António Pinho Vargas de que se escuta uma Pavana.

Entre os contemporâneos escolhidos estão também o sueco Mats Lidstrom, de quem se interpreta Fantasia, Maria João, Improvisação, Eurico Carrapatoso, Fuga, ou ainda o britânico Christopher Bochmann com a sua "transição atonal".

Côrte-Real escolheu a série de sete pavanas "Lachrimae" ou "Seven Tears", de Dowland, "fortemente marcada pela melancolia", como base deste registo.

"Lachrimae" são as "sete lágrimas representativas de sete estados de alma lacrimosos, todas baseadas no motivo inicial de ‘Flow my tears', um tetracorde descendente, figura emblemática do lamento", disse Côrte-Real, referindo que "o restante é constituído por uma série de danças, na maioria galhardas, que Dowland dedicou aos seus patronos, amigos e outras figuras da aristocracia inglesa".

Entre as peças gravadas está "I know not what tomorrow will bring", de Dowland, poema ao qual Côrte-Real juntou palavras que Fernando Pessoa escreveu no dia da sua morte, a 30 de novembro de 1935, em Lisboa.

"O núcleo do ciclo é constituído por sete canções do compositor inglês, que surgem intercaladas, sem interrupção, com outros tantos interlúdios instrumentais originais do compositor português. A escolha das canções obedece à lei do contraste: canções mais melancólicas, no espírito da pavana, alternam com outras mais animadas, decalcadas da galharda", referiu o musicólogo Afonso Miranda.

Para Afonso Miranda, "do ponto de vista formal os interlúdios recorrem a estruturas típicas do Renascimento tardio, como a pavana, fantasia ou a fuga, mas a escrita e a linguagem refletem o estilo de Côrte-Real; um estilo lírico, marcadamente melódico, assente numa harmonia predominantemente consonante e em estruturas rítmicas regulares e padronizadas, por vezes associadas à dança".

Côrte-Real não esconde o seu fascínio pela obra de John Dowland, personagem que "permanece envolvida numa certa aura enigmática" e que fez parte de uma "prodigiosa geração de músicos", que inclui William Byrd e Orlando Gibbons.

Todavia, Dowland foi "o mais célebre alaudista do seu tempo e deixou uma marca muito forte na música" do reinado de Isabel I, através das suas canções e, apesar da sua reputação, o músico viu sucessivamente ser-lhe recusada a candidatura ao posto de alaudista da corte, talvez devido à sua opção católica.

Dowland teve "uma vida errante e algo amargurada" de constantes viagens, a França, Alemanha, Itália e Dinamarca.

Nuno Côrte-Real dirige o Ensemble Darcos que acompanha a soprano Ana Quintans.

O ensemble é constituído pelos músicos José Pereira e César Nogueira (violino) Reyes Gallardo (viola d'arco), Marco Pereira (violoncelo), Duncan Fox (contrabaixo), Marina Camponês (flauta), Nuno Pinto (clarinete), Carolina Coimbra (harpa) Helder Marques (piano), e Marco Fernandes e Tomás Moital (percussão).

O alinhamento do disco inclui ainda Introdução de Maurice Ravel (1875-1937).