Foi uma mudança inesperada, feita poucos dias antes do concerto. A Galeria Zé dos Bois, que promoveu o espetáculo, decidiu trocar o Bairro Alto, onde habitualmente se realizam os espetáculos, pela igreja, obrigando os espetadores a atravessarem o cemitério e jardim adjacente. Os cenários urbanos foram esquecidos e o local a que nos dirigimos pareceu-nos mais próximo do sonho do que da realidade - um pouco, aliás, como a música de Holter.
A artista apresentou-se ao público em frente do altar da igreja, acompanhada por uma bateria, um violoncelo e um órgão eletrónico, que tocava. Começou com Marienbad - um tema que mostra um pouco o que a cantora californiana tem para oferecer: uma voz cristalina, música mais ambient que dreampop.
Com canções como Our Sorrows e This is Ekstasis hipnotizou a audiência, numa sala onde até as sombras ganharam vida. A iluminação suave criava, para as costas do público, uma enorme sombra do violoncelista, enquanto, à esquerda, graças aos relevos de uma meia-coluna, a silhueta de Julia se tornava desproporcional, assemelhando-se a uma boneca de porcelana.
Julia deixou para o final do espetáculo In the Same Room, o mais pop dos seus singles. Foi o momento mais animado, quase dançável, e um vislumbre do final de um sonho partilhado. Seguiu-se o retorno à normalidade, com o silêncio dos instrumentos, o pegar da mala da cantora e o inevitável acender das luzes.
Texto: Henrique Mourão
Fotografias: Luís Martins
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